Kátia Abreu, nueva ministra de Agricultura: «En Brasil no existe más el latifundio»

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Por Mónica Bergamo

O Brasil precisa de uma reforma agrária pontual, já que o latifúndio deixou de existir no país. Os conflitos fundiários com indígenas ocorrem porque eles «saíram da floresta e passaram a descer nas áreas de produção».

Recém­empossada ministra da Agricultura, a senadora Kátia Abreu (PMDBTO) não abandonou o discurso ligado ao agronegócio que a tem colocado em rota de colisão com movimentos sociais e com setores do PT.

Nesta entrevista à Folha, ela disse que recebeu da presidente Dilma Rousseff a missão de «revolucionar» a pasta e que não teme a contenção de gastos para este ano.

Folha ­- A senhora assume o ministério no momento em que grandes importadores de alimentos, como a China, crescem menos ou até enfrentam crise, como a Rússia. Como será o ano para o agronegócio?

Kátia Abreu ­- Há dificuldades, mas não temos muitos temores em relação às commodities de alimentos. A China, que importa 23% dos nossos produtos, pode parar de investir em uma porção de coisas. Mas 1,3 bilhão de pessoas lá seguem precisando almoçar, jantar e lanchar. Está havendo uma queda de preços [dos alimentos exportados], mas não creio em alteração de volume. Mesmo com o embargo [de potências internacionais], os russos continuam se alimentando de frango. As pessoas têm de comer. E a gente não exporta produtos muito agregados, consumidos por pessoas ricas. Exportamos é carne, que a massa come, um produto processado por lá.

A sua primeira viagem internacional será a esses países. Qual será a pauta?

Vamos assinar acordos firmes e claros para a habilitação, por exemplo, de novas fábricas frigoríficas no Brasil, para que elas possam exportar para esses países. Os chineses e os russos verbalizam: «Não queremos ficar na mão de JBS, Marfrig, Minerva [os maiores frigoríficos do país]». Eles querem ter mais opções de compra. Vamos ampliar as possibilidades.

Não haverá reação dos frigoríficos que já têm esse mercado?

Ninguém gosta de dividir nada, né? As pessoas, quanto mais ganham, mais felizes ficam. Mas cabe ao Estado brasileiro abrir oportunidades e fazer o jogo da nação. E não de corporações. Eu não posso focar o privilégio de alguns em detrimento dos demais.

Ainda sobre a crise: o ano será de contenção de gastos. Como ficará o orçamento do Ministério da Agricultura?

Todo mundo me fala: «Você vai brigar com o [ministro da Fazenda] Joaquim Levy». Gente, tenho uma tranquilidade tão grande! O setor [do agronegócio] é tão consolidado e dá respostas tão rápidas que é perigoso até ele me dar mais do que peço. É verdade! Ele não quer que o país se recupere? Vai recuperar com que, gente? Fabricando o que, a não ser comida? Então não tenho medo dos cortes do Levy. Ele vai investir em carne boa. Não vai investir em carne podre. O agronegócio não é carne podre.

Movimentos sociais que apoiaram a reeleição de Dilma Rousseff afirmam que a nomeação da senhora foi um tapa na cara deles.

Se eles me apoiassem, aí era difícil, né?

O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) diz que a senhora criminaliza os movimentos e até já pediu CPI contra eles.

Quero dialogar com eles. Diálogo sempre. E condenar invasão, sempre. Tem MST que invade, isso é ilícito, sim, e vai continuar sendo. Está na Constituição.

A senhora trabalha com a possibilidade de haver invasão em terras de sua família?

O que? O Ministério do Trabalho já pediu [documentos de propriedades] de 1987 para trás, quando o meu marido ainda era vivo. Eles vão à minha casa 24 horas por dia. Não acham nada. Meu filho não aguenta mais. Já invadiram também. Eu te falo com franqueza: não tenho nada contra assentamentos.

No Tocantins, sentei com o MST, eles me pediram ajuda. Tive audiência com o [então ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel] Rossetto para arrumar dinheiro para eles comprarem a fazenda de um cidadão. Se eu quero terra, por que eles não podem querer? Agora, não invade, pelo amor de Deus, porque não dá.

O país não necessita acelerar a reforma agrária?

Em massa, não. Ela tem de ser pontual, para os vocacionados. E se o governo tiver dinheiro não só para dar terra, mas garantir a estrutura e a qualidade dos assentamentos. Latifúndio não existe mais. Mas isso não acaba com a reforma. Há projetos de colonização maravilhosos que podem ser implementados. Agora, usar discurso velho, antigo, irreal, para justificar reforma agrária? A bancada [ruralista] vai trabalhar sempre, discutir, debater.

A senhora vai chamar os movimentos para dialogar?

Conflitos em outras áreas não são da alçada do Mapa [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento]. Meus colegas do Desenvolvimento Agrário, do Incra, podem mediá­los com competência. Agora, passou o pé para dentro da terra, tô dentro. Inclusive índio. Se quiser ajudar os índios a produzirem, sou a parceira número um. Faço isso no meu Estado.

A proposta da PEC 215, em discussão no parlamento, de passar a responsabilidade por demarcação de terras indígenas para o Congresso não traz o risco de que não se demarque mais nada no país?

Não. Porque não vai sair mais nada nunca do jeito que está. O STF já decidiu que terra demarcada não pode ser ampliada. Até então tinham saído várias, de forma equivocada, empurradas pela Funai [Fundação Nacional do Índio] a toque de caixa.

Enquanto os índios reivindicavam áreas na Amazônia, a gente nunca deu fé do decreto de demarcação [em vigor]. É um decreto inconstitucional, unilateral, ditatorial, louco, maluco. «E por que vocês só foram ver isso depois?» Porque os índios saíram da floresta e passaram a descer nas áreas de produção.

Não temos problema com terra indígena, a nossa implicância é com a legalidade. Se a presidenta entender que os pataxós estão com a terra pequena, arruma dinheiro da União, compra um pedaço de terra para eles e dá. Ótimo. Eu só não posso é tomar terra das pessoas para dar para outras.

As terras dos índios também foram tomadas.

Então vamos tomar o Rio de Janeiro, a Bahia. Por que [o raciocínio] só vale em Mato Grosso do Sul? O Brasil inteiro era deles. Quer dizer que nós não iríamos existir.

E os pequenos agricultores, haverá alguma política específica para eles?

Nós precisamos criar uma grande classe média rural brasileira. Ela hoje não existe. Dos cinco milhões de produtores do país, 300 mil são das classes A e B e só 796 mil da C. Nas classes D e E estão 70%, que contam com financiamento barato, mas não têm assistência técnica. Nós precisamos pegar essas pessoas, identificá­las, fazer editais e leilões para dar a elas assistência continuada. Eu tenho que fazer igual babá, decidir o que vai produzir. Não existe terra ruim. Tendo água, até na Arábia Saudita as pessoas plantam.

Haverá um «Proer» para o setor sucroalcooleiro?

Este é um assunto gravíssimo, que deve envolver todo o governo. A crise é total. Precisamos, em primeiro lugar, conhecer o endividamento do setor, que está alavancado em dólar. Não tenho a solução mágica. Mas temos de encontrar um mecanismo de estabilidade desse biocombustível [o etanol] que não seja só a ligação com o petróleo.

Uma das queixas do setor é a de que a Agricultura depende de tantos outros ministérios que acaba limitada.

A presidente Dilma me disse, de pronto, a minha missão: «Kátia, é para revolucionar». Nós não podemos mais ficar só anunciando Plano Safra todo ano, cento e tantos bilhões para isso, cento e tantos bilhões para aquilo. É muito pouco. Ela quer que o Ministério da Agricultura tenha uma interlocução forte com o Ministério dos Transportes para discutir logística, PAC 2, PAC 3.

Mas não haverá tantos recursos para os investimentos.

Temos de apostar tudo na privatização. A presidente inclusive enviará proposta ao Congresso mudando a legislação de hidrovias. Temos vários «Mississippi» maravilhosos. O correto é o governo fazer as hidrovias e depois concessionar para a iniciativa privada tocar.

A senhora é tida como ministra da cota pessoal de Dilma. Considera­se amiga dela?

Falar que é amiga de presidente pega mal. Não sou amiga da presidente. Sou fã da presidente. Ela é um ser humano bom. Ela tem espírito público. Ela vai para a luta. Ela não quer saber. Ela vai, nestes quatro anos, escrever uma bela biografia. E eu quero colaborar para escrever uma biografia maravilhosa para ela na minha área.

Folha de S. Paulo

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