Brasil | Hijas de la tierra: mujeres indígenas en lucha contra la pandemia

787

Por Vandreza Amante

Há muito tempo se passa a boiada em terras indígenas, e por vários estados do país, assim como o garimpo, a exploração madeireira e da borracha, a monocultura de soja, de milho, este último é um alimento sagrado para os povos originários, ou o fumo, utilizado em rituais sagrados. Historicamente, o processo de colonização se apropria do conhecimento milenar das sábias mulheres indígenas, as desumanizam, retira dia a dia a cultura, a tradição, a alegria e os seus conhecimentos por um ideal que destrói os seus modos de vida. Com a pandemia de coronavírus, mais uma doença que vem de fora das Terras Indígenas, as circunstâncias se agravam e o número de infectados em diferentes povos cresce em todo o Brasil. Diante a situação, os representantes dos governos se calam inertes. São as organizações da sociedade civil que, mais uma vez, buscam suprir, de maneira emergencial, a demanda cidadã por dignidade.

Pensando na realidade dos povos indígenas durante a pandemia a partir de hoje daremos início a série “Filhas da Terra” com textos para escutarmos as vozes das mulheres indígenas e tentarmos compreender os problemas cotidianos enfrentados e os desafios por que passam essas guerreiras. A equipe do Catarinas conversou com seis mulheres indígenas de todas as regiões do país, de diferentes povos indígenas, com as mais diversas pautas reivindicatórias. Mulheres que vivem em Terra Indígena (TI), mulheres que vivem nos centros urbanos, mães, estudantes, enfermeiras, artesãs para iniciarmos um panorama da luta das mulheres indígenas contra a pandemia de Covid-19. Elas fazem a diferença onde moram com suas ações em prol da coletividade.

Na região Sul, a cacica Ara’i Elizete Antunes do Povo Guarani, organiza as ervas medicinais, cuida do isolamento, da arrecadação de alimentos e de contribuições financeiras por conta da dificuldade de venda dos artesanatos da comunidade. No Sudeste, Avelin Buniacá Kambiwá, da etnia Kambiwá, mantém diálogo constante com a prefeitura para conscientização de que a saúde indígena e coletiva não são responsabilidades apenas da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), mas de todas as esferas (municipais e estaduais). Nesse sentido, há necessidade de um enfrentamento conjunto para frear o crescimento do coronavírus. No Nordeste, Magna Kaimbé é Técnica em Enfermagem. Ela trabalha no Posto de Saúde da aldeia Massacará, na Bahia, e atua na linha de frente do combate ao coronavírus em sua comunidade. Essas e outras histórias serão contadas ao longo desta semana no Portal Catarinas. Abaixo, confira mais sobre parte da realidade no Sul do Brasil.

Na contramão das ações das mulheres indígenas a insensata Ministra Damares vem a Santa Catarina para fazer a entrega de cestas básicas para os indígenas, retirando-os da segurança de suas terras e expondo seus corpos ao vírus. Ela e alguns funcionários da FUNAI testaram positivo para a Covid-19. Toda a ação é motivada por uma foto que entrará para a história oficial. Talvez esse seja o plano onde a raiz genocida do Estado se revela. A força da política mentirosa e ditadora está posta. Há disputa no jogo de poder que se apresenta como colonial, racista, genocida, ecocida, patriarcal, heteronormativo, religioso, branco e proprietário, ligadas a formação de novos grupos de poder aliados aos acordos internacionais. E nos perguntamos: Por que tantas indígenas afetadas pela pandemia de coronavírus na Amazônia?

Na última quinta-feira (2) o Ministério da Saúde levou 66 mil comprimidos de cloroquina para que nove povos das Terras Indígenas Yanomami e Raposa Serra do Sol possam complementar o tratamento contra a Covid-19, entre outros comprimidos e materiais de apoio à higiene. Ainda não se comprovou a eficácia do medicamento e seus efeitos colaterais podem piorar o quadro dos acometidos pelo coronavírus, dizem especialistas. Observamos que os acordos políticos não têm limites e o uso da cloroquina e hidroxicloroquina agora é obrigatório, beneficiando a indústria farmacêutica e seus intermediários em detrimento da saúde da população indígena.

Há muitos casos subnotificados de coronavírus entre os povos indígenas por conta da baixa testagem, descaso vivido por toda a população brasileira. Não há no horizonte uma discussão das autoridades competentes para que a vacina, quando acessada, seja destinada aos povos indígenas, parte do grupo prioritário. Até o início deste ano o governo federal não havia desenvolvido um plano de saúde pública para pandemias que contemplasse o coronavírus, sendo que já haviam informações sobre a circulação do vírus no Brasil.

Hoje entre os indígenas são mais de 11.385 casos confirmados em 122 diferentes povos, mais de 426 indígenas mortos, entre mulheres e homens sábios da terra, muitos idosos que viveram uma vida de luta pelo direito de ser e existir. Os dados são da Plataforma de monitoramento da situação indígena na pandemia do novo coronavírus (Covid-19) no Brasil. No Oeste de Santa Catarina indígenas Kaingang morreram acometidos pela pandemia. No mapa abaixo temos a dimensão visual do mapa da vulnerabilidade nos territórios indígenas por todo o país.

Mapa do risco nas Terras Indígenas /Imagem: Instituto Socioambiental (ISA)

No final do mês de junho (29), foi lançado o Plano de Enfrentamento da Covid-19 no Brasil chamado de Emergência Indígena. Uma proposta do movimento indígena e seus parceiros para orientar as ações e evitar o aumento da tragédia da pandemia de coronavírus entre os povos indígenas do país. Uma iniciativa da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), Articulação dos Povos Indígenas das Regiões Sudeste e Sul (ARPIN SUDESTE e ARPINSUL), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), ATY GUASU, Comissão Guarani Yvyrupa e Conselho do Povo Terena. O plano foi organizado durante o Acampamento Terra Livre e a Assembleia Nacional de Resistência Indígena realizadas de forma on-line neste ano. A proposta é um grande desafio desde sua criação uma vez que há indígenas que precisam de apoio em todo o território nacional por conta do alto índice de letalidade da doença.

“Em tempos de pandemia a luta e a solidariedade coletiva que reacendeu no mundo só será completa com os povos indígenas, pois a cura estará não apenas no princípio ativo, mas no ativar de nossos princípios humanos”. Trecho da Carta Final da Assembleia Nacional da Resistência Indígena de 2020.

Mesmo em risco os povos indígenas estão fazendo as próprias barreiras sanitárias, orientadas pelas anciãs, por suas rezas e pela medicina indígena. Pensam a vida de maneira global por compreenderem as responsabilidades coletivas enquanto sociedade. Na luta diária buscam combater as desigualdades estruturais distribuídas de forma desigual nas regiões, as vulnerabilidades que se aprofundam e marcam suas vidas.

REGIÃO SUL

No Litoral Sul do Brasil há mais de 120 casos de coronavírus entre indígenas de diferentes povos, mais de 30 casos suspeitos e um óbito.

Na Terra Indígena Guarani Yakã Porã, localizada no Morro dos Cavalos às margens da BR-101 (Palhoça, região da Grande Florianópolis/SC), vivem sete famílias, com 50 moradores. Todos contribuem de maneira coletiva com o sustento dos parentes. A cacica Ara’i Elizete Antunes conta que as mulheres vendiam artesanato para contribuir com as famílias, mas com a pandemia de coronavírus não estão conseguindo vender os seus artesanatos. Há alguns colaboradores, apoiadores e amigos que se sensibilizam com a situação da comunidade, fazem a arrecadação de alimentos e levam até a TI. “Está bem difícil pra gente, para as mulheres principalmente onde essa responsabilidade de sustentar os filhos, as crianças da comunidade, é responsabilidade nossa”, relata.

/FOTO: arquivo pessoal

Com sua experiência ela organiza com o apoio das outras pessoas, os caminhos que serão melhores para todas e todos, tanto na divisão das tarefas como na distribuição de alimentos e recursos financeiros. Segundo com a cacica muito da subsistência vem da terra, do que é plantado e colhido, mas é necessário tempo para que alimentos se desenvolvam. “A gente tira o nosso sustento do artesanato onde as mulheres produzem e saiam para vender, onde as pessoas também de fora vinham muito na comunidade para comprar os artesanatos. Falando pela minha comunidade, é uma comunidade que está começando agora e a gente tem muita dificuldade do meio de sustentar mesmo. A gente planta, mas tem um tempo também que dá, não é da noite para o dia. E aí então é onde a gente está tendo bastante essa dificuldade. Hoje também alguns trabalham por contratos, é onde a gente fica se ajudando. Um ajuda o outro”, comenta.

Na Yakã Porã a equipe de Saúde Indígena fez a distribuição de máscaras, álcool em gel, e as pessoas da comunidade foram orientadas a ficar em isolamento social. Como é de costume elas fazem o uso em seu cotidiano de ervas medicinais, plantas que utilizam para fortalecer a saúde. “A gente está em isolamento total mesmo, eu tenho muito esse cuidado com a comunidade, por ser pouco, e também a questão das crianças. Graças a deus que a gente não tem nenhum caso de Covid na comunidade, o cuidado assim é bem dobrado, seguimos as orientações de se cuidar, ficar em casa e quando sai também a gente usa máscara, o álcool em gel, onde a gente conseguiu pela equipe de saúde e muito remédio, ervas medicinais, ervas naturais. Mesmo a gente não estando com sintoma, mas a gente está nessa prevenção assim total”, explica Ara’i Elizete.

Tradicionalmente os grupos Guarani que compreendem os Ñandeva, Kaiowá, Mbyá entre outros subgrupos, habitam um território extenso entre a Argentina, Paraguai, Bolívia, Uruguai. No Brasil, estão em áreas entre o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Pará. É uma das maiores nações indígenas no Brasil e com maior presença territorial no Sul da América Latina. Essas terras em que habitam a milhares de anos eram mais abundantes em recursos naturais e muito maiores do que as áreas atualmente demarcadas pelo Estado. Segundo pesquisadores os Guarani, conhecidos na literatura como “carijós”, foram as primeiras pessoas contatadas pelos navegadores na chegada ao litoral do Sul do Brasil.

Mapa Guarani Digital das aldeias e sítios arqueológicos / Imagem: Mapa Guarani Digital

Segundo dados da FUNAI estima-se que atualmente no território brasileiro estão presentes 305 etnias, falantes de mais de 274 diferentes línguas. O Censo IBGE 2010 demonstrou que cerca de 17,5% da população indígena não fala a língua portuguesa num total de 817.963 pessoas. Destes, 315.180  vivem em áreas urbanas e  502.783 em áreas rurais. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), na América Latina vivem cerca de 45 milhões de indígenas em 826 povos que representam 8,3% da população.

É um momento de muitas incertezas, de falta de conhecimento das autoridades que trabalham com a desinformação como ferramenta política e que apostam na contradição da comunicação. Sob outro ponto de vista, mais do que tudo, precisamos estar atentas. Nesta crise socioambiental é necessário reformular as agendas, ouvir a ciência e a sabedoria dos povos originários. Olhar para a nossa própria história e aprofundar as análise dessa contradição.

*A série do Portal Catarinas Filhas da Terra: Mulheres indígenas em luta contra a pandemia Covid-19 irá publicar textos que irão abordar o contexto de como as mulheres indígenas estão vivendo na atualidade e de que forma a pandemia de coronavírus vem afetando o cotidiano dos povos indígenas. Acompanhe nossas postagens quinzenais e conheça o que as mulheres indígenas têm a dizer.

Catarinas


VOLVER

Más notas sobre el tema