Michel Temer, presidente de Brasil: »Si quieren, derríbenme»

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Por Fábio Zanini, Daniela Lima y Marina Días

Enfrentando a mais grave crise de seu governo, o presidente Michel Temer (PMDB) diz que renunciar seria uma admissão de culpa e desafia seus opositores: «Se quiserem, me derrubem».

Em entrevista à Folha no Palácio da Alvorada, Temer afirma que não sabia que Joesley Batista, que o gravou de forma escondida, era investigado quando o recebeu fora da agenda em sua residência em março –embora, naquele momento, o dono da JBS já fosse alvo de três operações.

Sobre o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures, flagrado correndo com uma mala de dinheiro, Temer diz que mantinha com ele apenas «relação institucional». A atitude de Loures, para o presidente, não foi «aprovável». Mas ele defende o caráter do ex-assessor. «Coitado, ele é de boa índole, de muito boa índole.»

O sr. estabeleceu que ministro denunciado será afastado e, se virar réu, exonerado. Caso o procurador-geral da República o denuncie, o sr. vai se submeter a essa regra?

Michel Temer Não, porque eu sou chefe do Executivo. Os ministros são agentes do Executivo, de modo que a linha de corte que eu estabeleci para os ministros, por evidente não será a linha de corte para o presidente.

Mas o sr. voluntariamente poderia se afastar.

Não vou fazer isso, tanto mais que já contestei muito acentuadamente a gravação espetaculosa que foi feita. Tenho demonstrado com relativo sucesso que o que o empresário fez foi induzir uma conversa. Insistem sempre no ponto que avalizei um pagamento para o ex-deputado Eduardo Cunha, quando não querem tomar como resposta o que dei a uma frase dele em que ele dizia: «Olhe, tenho mantido boa relação com o Cunha».

[E eu disse]: «Mantenha isso». Além do quê, ontem mesmo o Eduardo Cunha lançou uma carta em que diz que jamais pediu [dinheiro] a ele [Joesley] e muito menos a mim. E até o contrário. Na verdade, ele me contestou algumas vezes. Como eu poderia comprar o silêncio, se naquele processo que ele sofre em Curitiba, fez 42 perguntas, 21 tentando me incriminar?

O Joesley fala em zerar, liquidar pendências. Não sendo dinheiro, seria o quê?

Não sei. Não dei a menor atenção a isso. Aliás, ele falou que tinha [comprado] dois juízes e um procurador. Conheço o Joesley de antes desse episódio. Sei que ele é um falastrão, uma pessoa que se jacta de eventuais influências. E logo depois ele diz que estava mentindo.

Não é prevaricação se o sr. ouve um empresário dentro da sua casa relatando crimes?

Você sabe que não? Eu ouço muita gente, e muita gente me diz as maiores bobagens que eu não levo em conta. Confesso que não levei essa bobagem em conta. O objetivo central da conversa não era esse. Ele foi levando a conversa para um ponto, as minhas respostas eram monossilábicas…

Quando o sr. fala «ótimo, ótimo», o que o sr. queria dizer?

Não sei, quando ele estava contando que estava se livrando das coisas etc.

Era nesse contexto da suposta compra de juízes.

Mas veja bem. Ele é um grande empresário. Quando tentou muitas vezes falar comigo, achei que fosse por questão da [Operação] Carne Fraca. Eu disse: «Venha quando for possível, eu atendo todo mundo». [Joesley disse] «Mas eu tenho muitos interesses no governo, tenho empregados, dou muito emprego». Daí ele me disse que tinha contato com Geddel [V. Lima, ex-ministro], falou do Rodrigo [Rocha Loures], falei: «Fale com o Rodrigo quando quiser, para não falar toda hora comigo.»

Ele buscou o sr. diretamente?

Ele tentou três vezes me procurar. Ligou uma vez para a minha secretária, depois ligou aquele rapaz, o [Ricardo] Saud, eu não quis atendê-lo. Houve um dia que ele me pegou, conseguiu o meu telefone, e eu fiquei sem graça de não atendê-lo. Eu acho que ele ligou ou mandou alguém falar comigo, agora confesso que não me recordo bem.

Por que não estava na agenda? A lei manda.

Você sabe que muitas vezes eu marco cinco audiências e recebo 15 pessoas. Às vezes à noite, portanto inteiramente fora da agenda. Eu começo recebendo às vezes no café da manhã e vou para casa às 22h, tem alguém que quer conversar comigo. Até pode-se dizer, rigorosamente, deveria constar da agenda. Você tem razão.

Foi uma falha?

Foi, digamos, um hábito.

Um hábito ilegal, não?

Não é ilegal porque não é da minha postura ao longo do tempo [na verdade, está na lei 12.813/13]. Talvez eu tenha de tomar mais cuidado. Bastava ter um detector de metal para saber se ele tinha alguma coisa ou não, e não me gravaria.

É moralmente defensável receber tarde da noite, fora da agenda, um empresário que estava sendo investigado?

Eu nem sabia que ele estava sendo investigado.

O sr. não sabia?

No primeiro momento não.

Estava no noticiário o tempo todo, presidente [Joesley naquele momento era investigado nas operações Sepsis, Cui Bono? e Greenfield].

Ele disse na fala comigo que as pessoas estavam tentando apanhá-lo, investigá-lo.

Um assessor muito próximo do sr. [Rocha Loures] foi filmado correndo com uma mala pela rua. Qual sua avaliação?

Vou esclarecer direitinho. Primeiro, tudo foi montado. Ele [Joesley] teve treinamento de 15 dias, vocês que deram [refere-se à Folha], para gravar, fazer a delação, como encaminhar a conversa.

A imagem dele correndo com dinheiro não é montagem.

[Irritado] Não, peraí, eu vou chegar lá, né, se você me permitir… O que ele [Joesley] fez? A primeira coisa, o orientaram ou ele tomou a deliberação: «Grave alguém graúdo».

Depois, como foi mencionado o nome do Rodrigo, certamente disseram: «Vá atrás do Rodrigo». E aí o Rodrigo certamente foi induzido, foi seduzido por ofertas mirabolantes e irreais.

Agora, a pergunta que se impõe é a seguinte: a questão do Cade foi resolvida? Não foi. A questão do BNDES foi resolvida? Não foi.

O Rocha Loures errou?

Errou, evidentemente.

O sr. se sente traído?

Não vou dizer isso, porque ele é um homem, coitado, ele é de boa índole, de muito boa índole. Eu o conheci como deputado, depois foi para o meu gabinete na Vice-Presidência, depois me acompanhou na Presidência, mas um homem de muito boa índole.

Ele foi filmado com R$ 500 mil, que boa índole é essa?

Sempre tive a convicção de que ele tem muito boa índole. Agora, que esse gesto não é aprovável.

O sr. falou com ele desde o episódio?

Não.

O sr. rompeu com ele?

Não se trata de romper ou não romper, não tenho uma relação, a não ser uma relação institucional [com ele].

Quando o sr. diz para o Joesley que ele poderia tratar de «tudo» com o Rodrigo Rocha Loures, o que o sr. quer dizer?

Esse tudo são as matérias administrativas. Não é tuuudo [alongando o «u»]. Eu sei a insinuação que fizeram: «Se você tiver dinheiro para dar para ele, você entregue para ele». Evidentemente que não é isso. Seria uma imbecilidade, da minha parte, terrível.

O sr. o conheceu há quantos anos?

Quando ele era deputado, portanto, há uns dez anos.

E mesmo o conhecendo há dez anos, ele tendo sido seu assessor…

Mas espera aí, eu conheço 513 deputados há dez anos.

Mas apenas ele foi seu assessor próximo.

Como são próximos todos os meus assessores.

E mesmo próximo era apenas uma relação institucional?

Institucional, sem dúvida.

Nos últimos dias, o sr. veio numa escalada nas declarações. Acha que a Procuradoria-Geral armou para o sr.?

Eu percebo que você é muito calma [risos]. Espero que você jamais sofra as imputações morais que eu sofri. Eu estava apenas retrucando as imprecações de natureza moral gravíssimas, nada mais do que isso. Agora, mantenho a serenidade, especialmente na medida em que eu disse: eu não vou renunciar. Se quiserem, me derrubem, porque, se eu renuncio, é uma declaração de culpa.

No pronunciamento o sr. foi muito duro com o acordo de delação.

Não faço nenhuma observação em relação à Procuradoria. Agora, chamou a atenção de todos a tranquilidade com que ele [Joesley] saiu do país, quando muitos estão na prisão. Ou, quando saem, saem com tornozeleira. Além disso, vocês viram o jogo que ele fez na Bolsa. Ele não teve uma informação privilegiada, ele produziu uma informação privilegiada. Ele sabia, empresário sagaz como é, que no momento em que ele entregasse a gravação, o dólar subiria e as ações de sua empresa cairiam. Ele comprou US$ 1 bilhão e vendeu as ações antes da queda.

Se permanecer no cargo, em setembro tem de escolher um novo procurador. O sr. acha que tem condição de conduzir esse processo sem estar contaminado depois de tudo isso que está acontecendo?

Contaminado por esses fatos? Não me contamina, não. Aliás, eu tiro o «se». Porque eu vou continuar.

É preciso alguma mudança na maneira como esses acordos são feitos? Mudança na lei?

Acho que é preciso muita tranquilidade, serenidade, adequação dos atos praticados. Não podem se transformar em atos espetaculosos. E não estou dizendo que a Procuradoria faça isso, ou o Judiciário. Mas é que a naturalidade com que se leva adiante as delações… Você veja, as delações estão sob sigilo. O que acontece? No dia seguinte, são públicas. A melhor maneira de fazer com que eles estejam no dia seguinte em todas as redes de comunicação é colocar uma tarja na capa dizendo: sigiloso.

Esse processo dá novo impulso ao projeto de lei de abuso de autoridade?

É claro que ninguém é a favor do abuso de autoridade. Se é preciso aprimorar toda a legislação referente a abuso de autoridade, eu não saberia dizer. Abusar da autoridade é ultrapassar os limites legais.

O sr. falou muito do Joesley. Mas qual a culpa que o sr. tem?

Ingenuidade. Fui ingênuo ao receber uma pessoa naquele momento.

Além dos áudios, há depoimentos em que os executivos da JBS fazem outras acusações. Por exemplo, que o sr. pediu caixa dois em 2010, 2012 e 2016. Inclusive para o [marqueteiro] Elsinho Mouco, para uma campanha da internet.

No caso do Elsinho, ele fez a campanha do irmão do Joesley, e por isso recebeu aquelas verbas. Fez trabalhos para a empresa. Diz que até recentemente, esse empresário grampeador pediu se o Elsinho poderia ajudá-lo na questão da Carne Fraca.

Empresário grampeador?

Mas qual é o título que ele tem de ter? Coitadinho, ele tem de ter vergonha disso. Ele vai carregar isso pelo resto da vida. E vai transmitir uma herança muito desagradável para os filhos.

Nos depoimentos, há conversa do Loures com o Joesley sobre a suposta compra do Cunha que é muito explícita.

Por que é explícita?

Porque eles conversam sobre pagamentos.

Você está falando de uma conversa do Joesley com o Rodrigo. De repente, você vai me trazer uma conversa do Joesley com o João da Silva.

O Rocha Loures não é um João da Silva.

[Irritado] Eu sei, você está insistindo nisso, mas eu reitero que o Rodrigo era uma relação institucional que eu tinha, de muito apreço até, de muita proximidade. Era uma conversa deles, não é uma conversa minha.

Um desembarque do PSDB e do DEM deixaria o sr. em uma situação muito difícil. O sr. já perdeu PSB e PPS.

O PSB eu não perdi agora, foi antes, em razão da Previdência. No PPS, o Roberto Freire veio me explicar que tinha dificuldades. Eu agradeci, mas o Raul Jungmann, que é do PPS, está conosco.

Até onde o sr. acha que vai a fidelidade do PSDB?

Até 31/12 de 2018.

Até que ponto vale a pena continuar sem força política para aprovar reformas e com a economia debilitada?

[Irritado] Isso é você quem está dizendo. Eu vou revelar força política precisamente ao longo dessas próximas semanas com a votação de matérias importantes.

O sr. acha que consegue?

Tenho absoluta convicção de que consigo. É que criou-se um clima que permeia a entrevista do senhor e das senhoras de que vai ser um desastre, de que o Temer está perdido. Eu não estou perdido.

O julgamento da chapa Dilma-Temer recomeça no TSE em 6 de junho. Essa crise pode influenciar a decisão?

Acho que não. Os ministros se pautam não pelo que acontece na política, mas pelo que passa na vida jurídica.

Se o TSE cassar a chapa, o sr. pretende recorrer ao STF?

Usarei os meios que a legislação me autoriza a usar. Agora, evidentemente que, se um dia, houver uma decisão transitada e julgada eu sou o primeiro a obedecer.

O sr. colocou ênfase no fato de a gravação ter sido adulterada. Se a perícia concluir que não há problemas, o sr. não fica em situação complicada?

Não. Quem falou que o áudio estava adulterado foram os senhores, foi a Folha [com base em análise de um perito feita a pedido do jornal]. E depois eu verifiquei que o «Estadão» também levantou o mesmo problema. Se disserem que não tem modificação nenhuma eu direi: a Folha e o «Estadão» erraram.

Como o sr. vê o fato de a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] ter decidido pedir o seu impeachment?

Lamento pelos colegas advogados. Eu já fui muito saudado, recebi homenagens da OAB. Tem uma certa surpresa minha, porque eles que me deram espada de ouro, aqueles títulos fundamentais da ordem, agora se comportam dessa maneira. Mas reconheço que é legítimo.

Em quanto tempo o sr. acha que reaglutina a base?

Não sei se preciso reaglutinar. Todos os partidos vêm dizer que estão comigo. É natural que, entre os deputados… Com aquele bombardeio, né? Há uma emissora de televisão [TV Globo] que fica o dia inteiro bombardeando.

Essa crise atrasou quanto a retomada da economia?

Tenho que verificar o que vai acontecer nas próximas semanas. [Henrique] Meirelles [Fazenda] me contou que se não tivesse acontecido aquele episódio na quarta [dia da divulgação do caso], ele teria um encontro com 200 empresários, todos animadíssimos. causam um mal para o país.

Como o sr. está sentindo a repercussão de seus dois pronunciamentos, mais incisivo?

Olha, acho que eles gostaram desse novo modelito [risos]. As pessoas acharam que «enfim, temos presidente».

Folha de S. Paulo

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