Crisis carcelaria en Brasil: renuncia la cúpula del Consejo Nacional de Política Penitenciaria
Críticos do plano de segurança de Temer, conselheiros de política criminal renunciam
Às voltas com ações para solucionar problemas no sistema carcerário do país, o Ministério da Justiça terá de enfrentar, agora, uma crise interna. Isto porque ontem (25), sete integrantes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), vinculado à pasta, renunciaram aos seus cargos. Eles argumentaram que o gesto é um protesto contra a maneira como o ministro Alexandre de Moraes elaborou o Plano Nacional de Segurança Pública, que reúne itens com os quais não concordam. E, também, devido à portaria publicada ontem, que criou novos cargos no órgão.
Em carta aberta endereçada a Moraes, os técnicos criticam a nova índole do ministério – “mais armas e menos pesquisa”. O grupo também reclamou de ter sido excluído da discussão sobre a crise prisional e da implementação, pelo Executivo, de medidas para contenção da crise, o que chamaram de “ações políticas de ocasião”.
Na carta, os conselheiros que deixam o CNPCP, um dos órgãos mais antigos da pasta, afirmam que decisão foi tomada nesta terça-feira (24), com a publicação da resolução que criou novas vagas no órgão, com o propósito claro, segundo eles, de oferecer cargos de indicação do Executivo.
O número de vagas de suplência aumentou, uma manobra para ampliar as indicações do atual governo no CNPCP – que até então tinha 18 integrantes, sendo 13 indicados na gestão Dilma Rousseff, e cinco nomeados pelo governo Michel Temer).
Falta de diálogo
Na avaliação dos conselheiros que renunciaram, o ministro Alexandre de Moraes busca um «conselho servil» diante das intenções do governo de lidar com a crise carcerária do país. “A atual política criminal capitaneada pelo Ministério da Justiça, sem diálogo e pautada na força pública, tenderá a produzir tensões no âmago de nosso sistema prisional, com o risco da radicalização dos últimos acontecimentos trágicos a que assistiu, estarrecida, a sociedade brasileira”, destaca o documento.
No texto, os conselheiros reclamam ainda que a política criminal que o Executivo tenta reimplantar é “leiga, ineficaz e marcada por ares populistas e simplificadores da dimensão dos profundos problemas estruturais do nosso país”.
Assinam o documento Alamiro Velludo Salvador Netto, Gabriel de Carvalho Sampaio, Leonardo Costa Bandeira, Leonardo Isaac Yarochewsky, Marcellus de Albuquerque Uggiette e Renato Campos Pinto de Vitto, todos com currículos respeitado no mundo jurídico e acadêmico. Eles também destacam ser contrários ao uso de recursos do fundo penitenciário na política de segurança pública.
O Ministério da Justiça divulgou nota afirmando que o grupo que se despede identificava-se com a gestão anterior e que, com as mudanças, o Conselho passará por uma por renovação, “o que proporcionará melhor compreensão do dramático cenário herdado”. A pasta também ressaltou que o descalabro penitenciário não é de hoje e que o CNPCP tem papel relevante no enfrentamento da situação. “Agora, poderá aperfeiçoar sua contribuição, não apenas no diagnóstico da situação, mas, também, com medidas efetivas e corretivas”.
No tocante às críticas relacionadas ao Fundo Penitenciário Nacional, o ministério afirmou que não houve utilização destes recursos “para fins diversos do seu desiderato” e sim “o uso efetivo do fundo para o enfrentamento do drama penitenciário”.
Leia a íntegra da carta de renúncia:
Brasília, 25 de janeiro de 2017.
Exmo. Sr. Ministro de Estado da Justiça e Cidadania
Dr. ALEXANDRE DE MORAES
Prezado Senhor,
O Presidente e demais subscritores membros do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça e Cidadania (CNPCP/MJ) vêm, todos eles em caráter definitivo e irretratável, requerer o seu desligamento das vagas que ocupam e consequente encerramento das atividades que exercem nesse órgão colegiado. As razões, as quais sucintamente se expõem, são as seguintes:
1. Todos os subscritores desta renúncia coletiva receberam, cada um ao seu tempo e modo, o chamado para contribuir com a formulação da política criminal e penitenciária brasileira, conforme, inclusive, determinam os artigos 62 a 64 da Lei de Execução Penal, ao estabelecer as competências e atribuições inerentes e elementares do CNPCP.
2. Este trabalho, em todas as incumbências que lhe são pertinentes, sempre foi realizado com absoluta isenção de preferências político-partidárias, de tal modo que o único comprometimento de cada um dos conselheiros foi com a sua própria compreensão e consciência derivadas das respectivas experiências com as questões penais, buscando, apenas e tão somente, contribuir com o debate brasileiro, principalmente em face das conhecidíssimas mazelas de nosso sistema. Daí a ocorrência, entre todos nós, de divergências e convergências, vistas como salutares processos dialogados de construção de projetos, resoluções e atividades em geral.
3. A premissa essencial dessa forma de agir decorre do diagnóstico necessário a respeito da magnitude e importância da política criminal de uma sociedade. Se vista desta forma, não é aqui definitivamente o espaço adequado para projetar dissentimentos menores, pois nesse campo discutem-se, em última instância, os limites do poder do Estado, a efetivação da cidadania e a própria amplitude do conceito mais caro à nossa Constituição Federal de 1988, qual seja, a dignidade da pessoa humana.
4. O que se tem visto, entretanto, é a formulação de uma política, encabeçada por este Ministério, que ruma em sentido contrário a tudo isso. Navega com a popa da embarcação. Poder-se-ia nestas sintéticas razões de renúncia apontar muitos defeitos, vícios de compreensão e caminhos equivocados, ao menos em nosso sentir, pelo qual o Governo Federal conduz a sua forma de atuação no âmbito da execução penal.
5. Ressalta-se, nos últimos meses, o notório desprezo conferido ao Conselho nos temas mais relevantes ao Brasil na temática pertinente. Dias antes da crise prisional atingir patamar alarmante, a minuta de decreto de indulto aprovada pelo colegiado do CNPCP foi deixada integralmente de lado, optando-se pela formulação de um texto normativo que é, talvez, o mais restritivo em termos de liberdades já editado na história recente e republicana. Símbolo máximo disso é a exclusão do instituto da comutação. Conquistas gradativa e progressivamente obtidas foram abandonadas. A peculiar situação do encarceramento feminino, as dificuldades dos miseráveis presos brasileiros em arcarem com o pagamento das penas de multa, as enfermidades incuráveis do ambiente prisional e que afetam mortalmente centenas de condenados, a perpetuidade em que se transformam as medidas de segurança no Brasil, enfim. Tudo foi relegado ao esquecimento, a desprezar, inclusive, inúmeras pesquisas e trabalhos científicos a respeito da relevância da abordagem dessas peculiaridades no decreto de indulto.
6. A índole assumida por esse Ministério, ao que parece, resume-se ao entendimento, para nós inaceitável, de que precisamos de mais armas e menos pesquisas. Essa paradigmática frase não pode ser aplicada a lugar algum que envolva instâncias e políticas públicas e que se voltem, com ponderação, a resolver os complexos problemas de um País cujo traço secular é a desigualdade e a marginalização de parcela de sua população.
7. Defender mais armas, a propósito, conduz sim à velha política criminal leiga, ineficaz e marcada por ares populistas e simplificadores da dimensão dos profundos problemas estruturais de nosso País.
8. Viu-se, no último mês, e por melhor que possam ser as intenções, o lançamento de um Plano Nacional de Segurança Pública sem qualquer debate com a sociedade ou com as instâncias consultivas do Ministério. Ao mesmo tempo, incentiva-se uma guerra às drogas no Brasil que vai, outra vez, na contramão das orientações contemporâneas das Nações Unidas e de diversas experiências bem-sucedidas em países estrangeiros. Comete-se o equívoco de confundir, como se tratasse de algo único, política penitenciária e segurança pública, fator a redundar na utilização de verbas do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) para fins diversos de seu desiderato, conforme permitido pela belicista Medida Provisória nº 755, de 19 de dezembro de 2016. Planeja-se a destinação de recursos e efetivo das Forças Armadas para cuidar de um problema prisional e social que é fruto da incapacidade congênita do País em lidar com suas unidades penitenciárias e com as facções internas que surgem como subproduto do próprio caos penitenciário e que passaram a retroalimentar, sob as barbas do descaso estatal, o ciclo de exclusão, violência e encarceramento. Não se pode tratar jovens pobres e brasileiros como inimigos, por definição, do Estado.
9. Se não bastasse, no momento em que o Brasil vive a sua mais aguda crise penitenciária, cuja solução começa pela capacidade de diálogo das mais diversas esferas e instâncias públicas e privadas, o Ministério da Justiça investiu diretamente contra a autonomia e finalidade do próprio CNPCP. Cuidam-se de medidas que denotam, inclusive, alguma incompreensão do papel exercido pelo Colegiado consultivo, o qual não pode destinar-se à condição de simples avalista das políticas implementadas pelo titular do Ministério. A finalidade precípua do Conselho, e daí a real existência de um ente plural, é desferir críticas, postular mudanças, apontar defeitos.
10. O que se vê, entretanto, é uma clara tentativa de controle da voz a da opinião deste CNPCP. Em primeiro lugar, é criada por portaria uma Comissão do Sistema Penitenciário Nacional, o qual, se tem a virtude de reunir diversas entidades e ampliar por consequência o debate, estabelece, por outro lado, que os membros do CNPCP serão indicados pelo próprio Ministro, e não pelo Colegiado do qual são oriundos. Em outras palavras, ser do CNPCP para compor dita Comissão, nesta índole, é mera formalidade, pois não serão os componentes aqueles a quem, em si mesmos, o CNPCP conferiu legitimidade interna de representá-lo.
11. Em segundo lugar, determinou-se na última semana, por meio de outra portaria, o advento de oito novas vagas de suplência, o que, para além de violar a regra de iniciativa de modificação regimental do órgão, mostra-se como verdadeira afronta à autonomia do Conselho (artigo 24 do Regimento Interno – Portaria nº 1.107, de 5 de junho de 2008). Uma nítida mensagem ou moção de desconfiança aos seus atuais integrantes e, em consequência, o ímpeto de transformar o CNPCP em espaço endossatário das políticas, quaisquer que sejam, do Ministério (Portaria nº 81, de 19 de janeiro de 2017).
12. Esse papel de subserviência, é preciso dizer, não condiz com a história de quase quatro décadas do CNPCP e, principalmente, da missão institucional que ocupa o mais antigo Conselho do Ministério da Justiça. Não podemos, portanto, permanecer.
13. A atual política criminal capitaneada pelo Ministério da Justiça, a seguir como está, sem diálogo e pautada na força pública, tenderá, ainda mais, a produzir tensões no âmago de nosso sistema prisional, com o risco da radicalização dos últimos acontecimentos trágicos a que assistiu, estarrecida, a sociedade brasileira. Esperamos que dias melhores se avizinhem ao Brasil, porém, para tanto, a direção das políticas de governo na área penitenciária demanda mudanças.
Aproveitamos o oportuno para externar nossos votos de sucesso na política criminal a ser implementada. Estaremos sempre torcendo para que o melhor ocorra para e neste País.
ALAMIRO VELLUDO SALVADOR NETTO
Professor Associado do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Ex-Presidente da Comissão de Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional São Paulo. Advogado.
GABRIEL DE CARVALHO SAMPAIO
Advogado. Mestre em Processo Penal da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ex-Secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Foi membro do Conselho Nacional de Direitos Humanos. HUGO LEONARDO Advogado. Vice-Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa-IDDD. Produtor Executivo do documentário “Sem Pena”.
LEONARDO COSTA BANDEIRA
Advogado. Mestre em Ciências Penais pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
LEONARDO ISAAC YAROCHEWSKY
Advogado. Mestre e Doutor em Ciências Penais pela Universidade Federal de Minas Gerais. Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.
MARCELLUS DE ALBUQUERQUE UGGIETTE
Promotor de Justiça de Execução Penal do Estado de Pernambuco. Especialista em Ciências Jurídicas e Criminais. Professor de Direito Penal e Processual Penal. Mestrando em Educação. Coordenador do GAEP/MP-PE
RENATO CAMPOS PINTO DE VITTO
Defensor Público do Estado de São Paulo. Ex-Diretor-Geral do Departamento Penitenciário Nacional. Ex-Coordenador da Comissão de Justiça e Segurança Pública do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
Após 12 dias de rebeliões, governo do RN diz que 56 fugiram de Alcaçuz
Depois de 12 dias, o governo do Rio Grande do Norte divulgou que 56 presos fugiram do presídio de Alcaçuz, durante as rebeliões.
É a primeira vez que o governo admite que houve fugas do presídio de Alcaçuz, o maior do Rio Grande do Norte. Durante a contagem feita na terça-feira (24), os agentes concluíram que 56 presos estão foragidos e 26 morreram.
“Foram quebrados todos os pavilhões, os que eram divididos entre dois presídios passaram a habitar um único local, então a dificuldade da extensão de Alcaçuz provocou esse retardo no fornecimento de informações”, Walber Virgolino, secretário de Justiça do Rio Grande do Norte.
Desde o começo da rebelião a Força Nacional descobriu oito túneis perto dos muros do presídio. Depois da operação que durou seis horas na terça-feira (24), foi só a polícia sair e os presos voltaram a circular em Alcaçuz com facões e celulares.
A Secretaria de Justiça afirmou que nenhuma revista foi feita, apesar de ter sido anunciada pelo secretário de segurança na véspera da operação.
No maior presídio do Rio Grande do Norte, os presos continuam circulando livremente. Nesta quarta-feira (25), não havia nenhuma movimentação que indicasse a implantação das medidas anunciadas pelo governo para tentar retomar o controle da penitenciária.
Agentes que fazem parte da força-tarefa criada pelo governo federal chegaram ao estado. Eles vão reforçar os serviços de guarda, segurança e custódia dos presos.
O Rio Grande do Norte é o primeiro estado do país a receber os agentes da força-tarefa de intervenção penitenciária. Eles vão permanecer no estado por 30 dias e vão agir principalmente em Alcaçuz.
Sete dos 16 integrantes do Conselho de Política Criminal pediram demissão.
Todos foram nomeados no governo da ex-presidente Dilma Rousseff para o Conselho — que é um órgão consultivo ligado ao Ministério da Justiça. O grupo manifestou discordância das ações do ministro Alexandre de Moraes para enfrentar a crise carcerária. O Ministério da Justiça declarou que o grupo se identificava com a gestão anterior e que o descalabro no sistema penitenciário do país existe há décadas.
Enquanto autoridades discutem medidas, novos episódios agravam crise carcerária
Parlamentares, especialistas em segurança pública e autoridades do Executivo voltaram a olhar com mais atenção, nesta terça-feira (24), para as medidas de combate à crise carcerária do país, que não dá sinais de acabar. Coincidentemente, ao mesmo tempo em que o governo anunciou o início dos trabalhos do grupo integrado de agentes penitenciários, dois novos problemas surgiram em presídios e centros de detenção do Rio Grande do Norte e de São Paulo. No Rio Grande do Norte, houve confronto entre tropas de choque da polícia militar e detentos rebelados no complexo de Alcaçuz. Em Bauru, uma rebelião de mais de seis horas resultou na fuga de 152 detentos.
A rebelião de Bauru aconteceu no Centro de Progressão Penitenciária (CPP3) Professor Noé Azevedo. Segundo o governo paulista, 90 detentos foram recapturados, mas o clima ainda é de preocupação. O principal temor de forças de segurança e diretores dos ministérios da Justiça e da Defesa continua sendo que os casos de rebelião e a guerra entre facções criminosas cheguem com força aos presídios das regiões Sul e Sudeste.
Durante reunião nesta manhã para acelerar as ações de combate ao problema, foram discutidas as medidas já adotadas. Em Natal, o trabalho de segurança pública nas ruas por parte das Forças Armadas está sendo feito desde a última sexta-feira (20) e tem previsão de ser realizado até a próxima terça-feira (31), podendo ser ampliado. Contribuiu para pôr fim aos casos de ônibus incendiados na capital potiguar.
No fim desta semana, há previsão de ser iniciada também a vistoria, por parte de agentes especiais das Forças Armadas, nos presídios do estado, após a conclusão do mapeamento que está sendo feito pela área de inteligência do Exército e da Marinha.
Durante a manhã, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, assinou portaria que cria a chamada Força-tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP), conforme foi prometido anteriormente. O objetivo é reunir agentes penitenciários experientes de todo o Brasil para que sejam capacitados e integrem um grupo especial para atuar dentro dos presídios, em casos de crise.
Relatório da CDHM
Já por parte do Legislativo, os parlamentares da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara entregaram a representantes do Executivo, do Judiciário e dos governos estaduais do Amazonas e de Roraima relatório com resultado de diligência que avaliou a situação dos dois estados. No Amazonas, a comissão reclamou que por uma questão de segurança não pôde ser autorizada a entrar no local onde estavam os detentos da rebelião mais forte, ocorrida no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj).
Como os representantes da comissão só puderam conhecer a área administrativa, não tiveram condições de averiguar a situação em que os presos se encontravam, conversando com eles próprios. Segundo relato da secretaria de segurança pública daquele estado, o sistema penitenciário no Amazonas faliu. O governo estadual, afirmou o relatório, admitiu, inclusive, que as próprias iniciativas de gestão do sistema não surtiram efeito.
“Diante da falta de informações e de acesso aos presos, a CDHM constatou que os dados sobre o sistema prisional do Amazonas não estão disponíveis de forma acessível e clara para a sociedade”, destacou o documento.
“A gestão privada do Compaj não resultou em melhoria alguma para o sistema. Denúncias recebidas por essa comissão durante as diligências atestam que os funcionários da empresa terceirizada Umanizzare, contratada para a administração do local, não têm preparo para lidar com os presos, desconhecem ou não desenvolvem práticas de ressocialização, além de serem pelo menos em parte suspeitos de prática de corrupção”, acrescentou o relatório.
De acordo com a CDHM, um dos momentos mais importantes da diligência foi a reunião com familiares dos presos mortos ou que sobreviveram à chacina no Compaj. Mediado pela Pastoral Carcerária da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o encontro mostrou o ponto de vista das famílias, agregando informações que não puderam ser obtidas com os próprios detentos em função da restrição do acesso até eles, conforme contou o presidente da comissão, deputado João Carlos Siqueira, o Padre João (PT-MG).
Entre as reclamações feitas durante a diligência, o relatório informou, ainda, que os detentos enviavam cartas para a direção do Compaj contando que estavam sendo ameaçados de morte e que, durante as visitas, alguns presos faziam ameaças contra outros detentos exibindo armas pelas frestas das celas. Também denunciaram que todas as autoridades responsáveis tinham conhecimento da ameaça de chacina.
Em Roraima, onde foi permitido à CDHM entrar nas unidades prisionais e manter o diálogo com os detentos, ficou constatada a existência das facções do crime organizado atuando dentro do sistema prisional – Primeiro Comando da Capital (PCC), Comando Vermelho (CV) e Família do Norte (FDN). Foram tais facções, segundo as informações apuradas por agentes penitenciários e representantes da Pastoral Carcerária da CNBB e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), responsáveis diretas pelas mortes ocorridas em Boa Vista.
“Na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima, verificamos a existência de celas com capacidade para até oito pessoas abrigando 25 detentos. As celas não têm ventilação adequada nem iluminação, e toda a área está circundada por um esgoto a céu aberto. Não foi possível adentrar as alas para verificar a quantidade de presos por cela nem sua condição física. Em conversa na porta da ala, eles informaram que havia pessoas feridas e que necessitavam de atendimento médico”, afirmou o deputado Padre João.
Tortura e maus-tratos
Um dos pontos que mais chamou a atenção da comissão foi o relato de que práticas de tortura e maus-tratos contra os detentos são recorrentes tanto na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo como na Cadeia Pública Feminina de Boa Vista.
“As ameaças são feitas, inclusive, quando o presídio recebe visitas de comissões de Direitos Humanos e grupos que vão à Penitenciária Agrícola constatar as condições do cárcere. Na própria data da visita da CDHM, os presos retirados da cela para a reunião com nossa delegação ouviram dos agentes a frase ‘depois a gente conversa’, em tom de ameaça caso denunciassem algo que desagradasse ou causasse algum tipo de represália a eles. Muitos tiveram receio de se pronunciar no início do encontro com medo de serem torturados quando regressassem às celas”, disse o presidente da comissão.
O documento da comissão de DH recomenda que as defensorias públicas dos estados do Amazonas e de Roraima designem defensores públicos para atuar diretamente com a execução penal e no atendimento aos presídios; que estes estados ampliem o quadro de defensores “visando à garantia do devido processo legal e acesso à justiça para as pessoas privadas de liberdade”.
Sugere também que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e os Tribunais de Justiça dos dois estados adotem providências em conjunto para promover medidas de desencarceramento. Principalmente quanto às prisões preventivas em casos de crimes cometidos sem violência ou grave ameaça e verificação de prazos para concessão de progressões de regime e outros benefícios.
A CDHM recomendou, ainda, que os estados ampliem o quadro de agentes penitenciários, permitindo que as atividades da administração carcerária sejam realizadas com maior segurança para os detentos e os agentes públicos. E a realização de investigações sobre denúncias diversas, incluindo as empresas que administram os presídios e sobre a péssima qualidade da alimentação fornecida nas unidades prisionais.