Prisão, COVID19, Convívio e Resistência – Por Ivan Seixas
Por Ivan Seixas*, especial para NODAL
Nesses tempos de isolamento provocado pelo COVID-19, obviamente, me vem à lembrança os tempos estive na prisão. Também é óbvio que não se pode comparar as condições de vida nas mãos de uma ditadura assassina com estar em casa sem poder sair pelo mundo, mas a restrição de andar sem impedimentos é sempre motivo de comparação.
Nos tempos de prisão durante a ditadura militar éramos obrigados a ficar confinados em celas muito pequenas, com um grande número de pessoas juntas no mesmo espaço, pessoas de origens e formação totalmente distintas, e isso obrigava a todas pessoas lá reclusas a uma mudança de hábito e de comportamento. Antes de tudo, todas as pessoas tinham que respeitar o espaço e as características das demais. Além disso, a convivência diária e constante 24 horas ao dia e todos os dias obrigava a ter uma disciplina e uma rotina que contemplasse ao coletivo. Tudo se referenciava ao coletivo e as individualidades deveriam ser respeitadas. Era triste a prisão, mas tínhamos que enfrentar altivamente.
Nestes tempos de corona vírus acontece a mesma coisa. Mesmo sendo um isolamento voluntário e uma convivência também voluntária, as mesmas regras e características de vida em comum precisam ser respeitadas para que as pessoas não passem a se agredir mutuamente e não rompam o isolamento por esses mesmos motivos. É triste, mas é a realidade que temos que viver. Como se estivéssemos numa prisão política, temos que enfrentar altivamente mesmo que seja difícil.
Em ambas as situações é fundamental manter a tranquilidade e o bom humor. Aos nossos captores e carcereiros era incompreensível como pessoas que tinham sido trituradas na tortura e eram mantidas encarceradas poderiam ter bom humor, sorrir e fazer piadas com a situação tenebrosa em que vivíamos. Apesar de ser contraditório, era o que nos mantinha vivos. Agora também é o que nos manterá vivos.
Nas cadeias sofríamos muito ao saber que mais uma companheira ou mais companheiro havia sido capturado e assassinado pela ditadura militar. A perda nos abatia, mas precisávamos manter a calma e altivez para continuar enfrentando a fera ditatorial e genocida. Isso é muito similar ao que vivemos no momento atual. Nos abate e entristece saber que morreu vítima do vírus um amigo ou amiga, um intelectual ou artista que todos gostamos. Mas, temos que manter a calma e a firmeza de não ceder ao desânimo e à insensatez de romper com as recomendações médicas.
Nós, no Brasil, vivemos uma situação duplamente dramática. Além do risco de contaminação do corona vírus, temos que enfrentar um governo dirigido por um psicopata, com características genocidas, respaldado por uma burguesia escravagista e extremamente gananciosa. Como enfrentamos e conseguimos superar uma ditadura militar de vinte e um anos, vamos também superar a atual ditadura da insanidade e da ignorância a que estamos obrigados a suportar.
*Ivan Seixas – Capturado pelo exército, em abril de 1971, por ser militante do MRT – Movimento Revolucionário Tiradentes, junto com seu pai, o operário Joaquim Alencar de Seixas, que foi assassinado na tortura, passou quase seis anos nas prisões da ditadura militar.