Com trabalho precário, população ocupada atinge maior nível da história – Por Flavia Lima e Lucas Vettorazzo

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O mercado de trabalho chega ao fim de 2018 com um aparente paradoxo: ao mesmo tempo em que o número de desempregados ainda é bastante alto (12,2 milhões), a população ocupada atingiu o maior nível da série histórica (93,1 milhões).

Os números parecem incoerentes, mas têm uma origem comum: as marcas de uma recessão econômica que custa a ser superada por completo.

A mesma crise que fechou perto de 4 milhões de vagas com carteira de trabalho nos últimos quatro anos e fez a taxa de desemprego explodir trouxe um contingente enorme de pessoas para o mercado de trabalho que antes não precisava trabalhar.

“É o membro da família indo para a informalidade porque o chefe de família perdeu o emprego, o estudante que precisou complementar renda para pagar os estudos ou que deixou de estudar porque precisou trabalhar”, diz Cosmo Donato, economista da LCA Consultores.

Donato se refere às pessoas que, levadas pela crise, aceitaram um emprego sem carteira assinada ou com um salário mais baixo para sobreviver.

Ainda que empregadas em postos com qualidade inferior, essas pessoas estão incluídas no total de população ocupada, o que explica a explosão desse número.

A despeito do nível recorde de ocupação, o país chega ao fim de 2018 com uma taxa de desocupação ainda alta —certamente um dos grandes desafios herdados pelo futuro governo de Jair Bolsonaro.

No trimestre encerrado em novembro, o desemprego atingiu taxa de 11,6%, ou 12,2 milhões de pessoas desocupadas, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados na sexta-feira (28). No entanto, houve uma queda 0,4 ponto no desemprego em relação a igual trimestre de 2017, quando a taxa era de 12%.

Segundo o IBGE, o fim do ano é, historicamente, um momento de recuo do desemprego em razão das contratações nos setores de serviços e da indústria. Neste trimestre, diz o IBGE, dois componentes adicionais ajudaram: as eleições e a Black Friday.

Nos dois casos, disse o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, houve a contratação de funcionários extras, embora a maioria tenha sido admitida de maneira informal.

É essa dinâmica que faz com que, apesar do recorde na ocupação, o mercado ainda viva um momento historicamente difícil, disse Azeredo.

“É uma informalidade ainda muito ligada ao ambulante ou ao motorista de aplicativo”, disse Azeredo. “Isso é ruim porque, no Brasil, a carteira de trabalho protege o trabalhador em caso de demissão e, muitas vezes, é um passaporte para a tomada de crédito e ao consumo de bens.”

As vagas que motivaram a leve queda da taxa de desemprego são basicamente de trabalhadores por conta própria ou de empregados sem carteira assinada no setor privado.

Os sem-carteira somaram 11,7 milhões em novembro —pico da série histórica. Os 23,8 milhões de trabalhadores por conta própria também são o maior contingente da série, iniciada em 2012.

Na outra ponta, os postos com carteira assinada atingiram o menor nível da série, com 32,9 milhões de pessoas nessa condição. No auge, em maio de 2014, 36,7 milhões de pessoas eram formais.

Segundo Fernando Montero, economista-chefe da corretora Tullett Prebon, do total de 1,2 milhão de novas ocupações abertas em 12 meses, as vagas informais responderam por 992 mil, seguidas pelo setor público (+216 mil vagas).

O emprego com carteira assinada (incluídos setor privado, domésticos, empregadores e conta própria com CNPJ) foi responsável por apenas 33 mil novos postos.

“Está difícil conseguir emprego com carteira no país, mas a dificuldade está se reduzindo levemente”, diz Lucas Souza, analista da Tendências.

Para Souza, a volta da formalização dependerá da retomada da atividade econômica, muito condicionada à aprovação de reformas econômicas, como a da Previdência.

Apesar de a incerteza política que paralisou a economia brasileira no último ano ter se reduzido com a definição da eleição, diz o economista, ainda há uma certa dose de desconfiança do mercado com os rumos do novo governo.

“Há uma correlação alta entre a volta da atividade econômica e os postos com carteira assinada. É consenso no mercado hoje que ‘puxadinho’ de reformas passadas não resolverá o problema”, diz Souza.
Prova de que a situação ainda é bastante delicada é que continua alto o contingente de desalentados no país —as pessoas que desistiram de procurar emprego.

No intervalo de um ano, 426 mil pessoas ingressaram nessa condição. Em novembro, o país tinha 4,7 milhões de pessoas desalentadas e outros 27 milhões de subocupados (pessoas que trabalham menos horas do que gostariam).

Donato, da LCA, prevê recuperação gradual do mercado de trabalho. Em suas contas, o desemprego ainda estará em 11% no fim de 2019.

Folha de S. Paulo

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