Cómo el canciller de Bolsonaro defendía al gobierno de Lula en 2008

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Como o chanceler de Bolsonaro defendia o governo Lula em 2008

Quando o diplomata Ernesto Araújo tinha 41 anos e era apenas conselheiro no Itamaraty, publicou uma tese de 352 páginas na qual defendeu ideias bem diferentes das atuais.

Aos 51 anos, ele vai chefiar o Ministério das Relações Exteriores do governo de Jair Bolsonaro a partir de 1º de janeiro de 2019. Araújo veio a se tornar um dos mais ferrenhos críticos do PT, das esquerdas e do que ele chama de “marxismo cultural”. Entretanto, o que a tese publicada por ele mesmo em 2008 mostra é um diplomata alinhado com o petismo e com uma estratégia de relações exteriores que o partido do poder vinha então implementando. Os posicionamentos – embora contraditórios – são defendidos por Araújo com a mesma veemência. O documento de 2008, chamado “Mercosul: Negociações Extra-Regionais”, foi apresentado por Araújo ao CAE (Centro de Altos Estudos) do Itamaraty.

Tratava-se de cumprimento de uma etapa obrigatória para progredir na carreira diplomática, passando de conselheiro para ministro de segunda classe. Hoje, Araújo é embaixador. Está portanto, no topo da carreira. Quando escreveu essa tese, Araújo era chefe da Divisão de União Europeia e Negociações Extra-Regionais do Mercosul. Logo em seguida, assumiu posto em Ottawa, no Canadá, onde ficou até 2010. As ideias do diplomata sobre ideologia e “terceiro mundismo” estavam alinhadas em 2008 às ideias defendidas pelo então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. Aquele período marcou o auge do que o chanceler Amorim batizou de “política externa ativa e altiva”. Essa política foi caracterizada pela abertura de novas frentes de relação política e de negócios com países em desenvolvimento, ou do eixo sul-sul, como eram chamados os países africanos e sul-americanos, além das potências médias como a Índia, ou de antagonistas dos EUA, como Rússia e China.

No documento de 2008, Araújo se propõe a rebater “a linha do setor privado abertamente crítica ao governo brasileiro, à qual se unem correntes políticas e setores da imprensa sistematicamente contrários a toda a atuação externa do governo Lula”.

As críticas à ideologia, de 2008 a 2018

Em artigo publicado na segunda-feira (25) no jornal Gazeta do Povo, Araújo pergunta: “você, leitor, diz que quer acabar com a ideologia em política externa? Eu também quero. Essa é a principal missão que o presidente Bolsonaro me confiou: ‘libertar o Itamaraty’ do que seria uma herança nociva deixada pelo PT”.

Dez anos atrás, quando Araújo falava sobre a política externa petista, ele dizia o seguinte: “tem-se repetido à saciedade, principalmente em órgãos da imprensa brasileira, a asserção de que o Mercosul, movido pelo Brasil, adota uma política comercial ideológica”. Logo em seguida, ele refuta a ideia de um bloco sul-americano ideológico. O Araújo reclama então de setores que viam “no Itamaraty a fonte de uma ‘ideologia’ contrária a acordos com os [países] desenvolvidos e direcionada a parcerias sem valor comercial com sócios do ‘terceiro mundo’”.

O tema do Mercosul é especialmente importante nesse debate porque a acusação de que o PT pautou as relações exteriores por preferências ideológicas se apoia principalmente nas relações desenvolvidas à época com países da América do Sul, governados então por presidentes de esquerda.

Aos que à época acusavam o governo petista de agir ideologicamente nesse campo, Araújo respondia nos seguintes termos: “a visão segundo a qual o Brasil é ideológico nas negociações extra-regionais do Mercosul é ela mesma ideológica, pois fundamenta-se na concepção de que ampliar os laços com países ricos nos fará também ricos, graças a uma espécie de contato mágico, independentemente de saber se esses laços constituem-se ou não em instrumentos desequilibrados e desfavoráveis ao Brasil.”

– “A argumentação ‘anti-ideológica’ vai sempre no sentido de que convém negociar com os grandes mercados […] Ignora, ademais, o fato de que os mercados em mais forte expansão no mundo há vários anos são os de países em desenvolvimento” – Ernesto Araújo Quando conselheiro do Itamaraty, em 2008, em tese chamada “Mercosul: Negociações Extra-Regionais”, no CAE (Centro de Altos Estudos) do Itamaraty.

– “Se a prioridade é extrair a ideologia de dentro do Itamaraty, não lhe parece conveniente ter um chanceler capaz de compreender a ideologia que existe dentro do Itamaraty? Alguém que estuda essa coisa nos livros, há muitos anos, e não simplesmente ouviu alguma referência num segmento do Globo Repórter?” Ernesto Araújo Futuro chanceler brasileiro, em artigo publicado nesta segunda-feira (25), na Gazeta do Povo.

Hoje, o governo eleito de Bolsonaro promete defender o “pragmatismo” nas relações exteriores, em substituição ao que se apresenta como uma pauta “ideologizada”. Mas, em 2008, Araújo dizia: “que significa o ‘pragmatismo’ que tantas vezes se prega como a necessária linha-mestra das negociações do Mercosul? Tende a significar o abandono das próprias posições, aderindo às da outra parte”.

Apoio e críticas ao ‘terceiromundismo’

“Terceiromundismo” é uma expressão leiga, que, de forma pejorativa, se refere a uma suposta preferência por manter relações com países do dito terceiro mundo (em desenvolvimento) em vez de manter ligações com países de primeiro mundo (desenvolvidos). O Araújo de hoje critica “o terceiro-mundismo automático e outros arranjos falsamente anti-hegemônicos”, como sendo parte da “ideologia do PT, ou seja, do marxismo, que ainda está muito presente no Itamaraty.”

Porém, no artigo de 2008, considerava que a opção do comércio sul-sul, ou “terceiro mundista”, apresentava-se como uma estratégia natural, diante das oportunidades que esse mercado oferecia.

Defesa da permanência da Venezuela

As críticas ao “comunismo” e à Venezuela marcaram a campanha eleitoral de Bolsonaro. Porém, Araújo defendia, em 2008, a permanência do governo venezuelano como membro associado do Mercosul.

“Importa, de qualquer modo, que as vantagens ou inconvenientes da permanência ou saída da Venezuela, no que respeita ao relacionamento extra-regional, sejam analisadas do ponto de vista do Brasil e do Mercosul, e não dos EUA ou da União Europeia”, dizia Araújo. “Caso seja possível mantê-la e absorvê-la no bloco, levando a Venezuela a seguir parâmetros de relacionamento externo construtivo, isso constituirá no longo prazo um reforço do Mercosul inclusive no seu relacionamento com terceiros”, dizia o hoje chanceler indicado. A Venezuela pediu para associar-se ao Mercosul em 2006.

Tornou-se membro associado do Mercosul em 2012, mas foi suspensa do bloco em 2016, como reprimenda pelos ataques do presidente Nicolás Maduro à democracia no país. “A saída da Venezuela traria vantagens mais imediatas em termos de alívio de tensões, mas não significaria que o Mercosul subitamente pudesse tornar-se mais maleável aos países centrais ou disposto a seguir um modelo de integração periférica e ‘apolítica’”, concluiu à época.

O Nexo pediu entrevista sobre o assunto ao diplomata, por meio do Itamaraty, que respondeu que “no momento o embaixador Ernesto Araújo não tem disponibilidade na agenda para entrevistas”.

Nexo Jornal

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