Indícios de fraude e um presidente tão desprezado quanto o Nobel – Por Camilo Rengifo Marín
Por Camilo Rengifo Marín*
Juan Manuel Santos, Nobel da Paz em 2016, é um presidente que ficou sozinho, tão desprezado como o próprio prêmio, enquanto surgem denúncias de uma rede de fraudes eleitorais a poucas semanas do primeiro turno das presidenciais, corrida que tem o ultradireitista Iván Duque e o centroesquerdista Gustavo Petro encabeçando as pesquisas.
As acusações públicas indicam que há uma ampla e complexa rede de funcionários inescrupulosos, que vão desde os registros eleitorais até a direção do órgão responsável, passando também pelos fiscais que auditam a apuração final, e que são decisivos, especialmente em eleições legislativas, para definir as últimas vagas.
A tendência do pleito principal é a de uma definição no segundo turno. A força de Duque se apoia no uribismo consistente no interior e na região central do país. Isso o favorece não só porque assegura um importante piso eleitoral, que o impulsou ao primeiro lugar nas pesquisas, mas também porque se trata de um eleitorado bastante sólido, que efetivamente vota nas eleições.
Mas esse eleitorado rural do centro não será suficiente para assegurar a vitória. Será preciso também o apoio de uma parte do voto urbano, particularmente nas capitais do centro do país.
Por sua parte, Gustavo Petro conseguiu se consolidar como um candidato forte desde o princípio do ano, marcando uma tendência de crescimento lento porém contínuo nas pesquisas, com uma campanha eficaz e muito ativa, focada corretamente nas bases territoriais. Segundo a pesquisa Invamer, Petro vence Duque em Bogotá, e sobretudo na zona litorânea caribenha – que se decidisse sozinha a disputa lhe daria uma vitória no primeiro turno.
O informe-denúncia sobre fraude foi publicado pela Fundação Paz e Reconciliação e relata casos clássicos de manipulação da contagem de votos: por exemplo, quando a pré contagem aponta um candidato a senador como próximo de conseguir uma vaga, os operadores atuam para assegurar que a contagem final inclua esse candidato entre os vencedores. O preço para ter operadores e até fiscais atuando a ser favor pode chegar a 2,5 milhões de pesos colombianos (uns 900 mil dólares). Sobre o papel dos fiscais, alguns são escolhidos aleatoriamente, mas uma parte é indicada para favorecer candidatos.
Nas últimas eleições internas da Colômbia, se viu esse comportamento em toda a sua dimensão, além da direta interferência nos processos de seleção dos candidatos por parte dos fiscais eleitorais, escondendo cédulas da consulta, tal como mostraram alguns vídeos que viralizaram nas redes. É uma forma de se manter no poder: as práticas de fraudes e pactos entre os poderosos no país são conhecidas ao longo da história, e continuam estando presentes na política do país. O temor é que essas manipulações constatadas no pleito legislativo se repitam nos dois turnos da disputa presidencial.
A solidão de Santos
Um livro da jornalista Vicky Dávila conta com entrevistas dos atuais candidatos à presidência e à vice-presidência em todas as eleições desde 2010 até a atual, e um dos temas da obra é tentar de explicar porque Juan Manuel Santos, depois de dois mandatos e um acordo de paz que lhe valeu um Prêmio Nobel, tem tão pouca popularidade no país. A conclusão (dos outros políticos) é que o atual mandatário “faz política de forma desleal” – teria dito literalmente um dos entrevistados.
Santos não alcançou consensos sólidos sobre o processo de paz e teve muitos problemas não só na negociação com as FARC (guerrilha transformada em partido político legal depois dos acordos) como também pelos quilômetros de mar territorial que perdeu no litígio com a Nicarágua, pelos escândalos com a Odebrecht, por sua briga com Uribe, entre outras dificuldades.
O livro soma indícios, como o informe de uma empresa de segurança privada sobre Germán Vargas – o atual candidato presidencial governista, outrora vice-presidente –, que revela microfones e câmaras em seu quarto e na sala de reuniões, algo que Santos jamais investigou. O ex-presidente Ernesto Samper comentou a situação: “creio que Santos é uma pessoa movida por dois sentimentos: a ambição e a inteligência. É um ambicioso inteligente, o que o torna mais perigoso”.
Na última sexta-feira (27) de abril, Santos afirmou que, segundo fontes de inteligência, a Venezuela estaria “preparando artigos novos de sua Constituição para fazer eleições indiretas, como no modelo cubano” e que o país avançaria a “uma ditadura soviética, com mecanismos sofisticados de controle”. Estas premonições já formam parte do manual de mitomania dos presidentes que integram o Grupo de Lima.
A casualidade fez com que sua denúncia se produzisse um dia antes de que a Fundação Paz e Reconciliação publicasse o informe que revela como 10% e 20% dos postos do Senado colombiano estão sob risco de serem comprados por candidatos junto a funcionários eleitorais, deixando vigente a sensação de uma possível grande fraude eleitoral se instalando em todos o país.
(*) Camilo Rengifo Marín é economista e acadêmico colombiano, investigador do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)