Intelectuais macristas criticam o governo – Por Rubén Armendáriz

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Rubén Armendáriz*

Dois grupos de intelectuais conhecidos por apoiar o presidente argentino Mauricio Macri, o Clube Político Argentino (CPA) e o Espaço de Pensamento Crítico, criticaram pública e severamente a administração e colocaram em xeque a qualidade institucional do governo, que chega à metade do seu mandato.

O Clube Político Argentino (CPA), falou em “erros que custam caro”, e chegou a debater inclusive a renúncia do ministro do Trabalho, Jorge Triaca, envolvido num escândalo pela demissão de uma empregada doméstica – Sandra Heredia, a quem ele empregava sem contrato, e logo a colocou para trabalhar no Sindicato de Operários Marítimos Unidos (SOMU), o qual está sob intervenção judicial, ainda que seja pela Justiça influenciada pelo Governo.

O CPA, que tem como objetivo ser guarda intelectual e moral do bloco Cambiemos (aliança política macrista) e dos governos nacional e da capital, tem como presidente o cientista político Vicente Palermo, e como vice o economista Guillermo Rozenwurcel, além o tesoureiro Guillermo Yanco – esposo de Patricia Bullrich, ministra de Segurança – entre outros membros destacados. Sua declaração reclama pelo fato de que as iniciativas governamentais estarem sempre subordinadas às necessidades da conjuntura, o que favorece a lógica da polarização eleitoral, segundo a qual exibir o perfil negativo dos adversários mais desacreditados bastaria para manter o apoio da cidadania.

“Ao optar por esta via, aparentemente fácil, o Governo (…) se limita a tirar proveito dos escândalos que são de responsabilidade dos seus antecessores e adversários mais virulentos, mas também perde oportunidades – trabalhosas, mas que mostrariam suas virtudes – para terminar com as inaceitáveis “regras do jogo” que vêm de longe e que são, finalmente, as que possibilitam esses escândalos”, diz o texto.

O CPA defende que nada autoriza o nepotismo praticado por funcionários do Executivo, mantendo a prática de aproveitar o privilégio de cumprir uma função pública para nomear parentes e amigos nas estruturas do Estado, o que significa degradar o processo de mudança institucional prometido. “Por esse caminho, tudo tende a se nivelar por baixo, e essa será a conclusão que fica para a opinião pública”, diz.

O documento fala da luta contra a corrupção sindical e política, atada ao modo em que o governo decidiu dosificar e dilatar a reforma do Poder Judiciário, tendo em vista a manipulação que a maioria dos juízes do foro penal praticam nas causas sob sua responsabilidade, “simulando avanços que não são reais, trocando gestos por decisões a favor do Conselho da Magistratura, e outros manejos inadmissíveis em diversas instâncias da administração da Justiça, cuja reforma requer ações legislativas específicas”. Ademais, indica que é inadiável a medida de delegar o trabalho do Departamento Anticorrupção a pessoas que não estejam diretamente identificadas com o partido governante, e que este organismo deve ser política e administrativamente independente do Executivo, pois hoje suas investigações carecem de credibilidade.

O CPA exige do governo um esforço mais decidido e consistente para respeitar e fazer respeitar a lei, diferenciar o Estado do grupo governante, garantir l transparência e castigar as violações à ética pública, sobretudo as cometidas por próprios e aliados.

“Seguir comportando-se como uma facção em pugna com outras não fortalecerá o sentido da coisa pública em nosso país, e sem uma mudança cultural profunda nesse quesito não avançaremos, mesmo se conseguirmos manter o crescimento económico por alguns anos e consolidar a atual distribuição de poder“, argumenta.

Economia e direitos humanos

Outro grupo de intelectuais, reunidos no coletivo Espaço de Pensamento Crítico, apontou suas fortes críticas às políticas econômicas e de Direitos Humanos impulsadas pelo governo de Mauricio Macri. Entre os que assinaram a declaração se destacam Roberto Gargarella, Rubén Lo Vuolo, a socióloga Maristella Svampa e a escritora Beatriz Sarlo. Para eles, as políticas implementadas são “um grave retrocesso em questões de liberdades individuais”.

Para analisar o desempenho do Governo a respeito dos direitos humanos, o coletivo se baseou em três aspectos: os protestos sociais, a problemática indígena e a segurança da cidadania. Consideram que “a violência institucional se agravou” na Argentina, e citam o caso de Santiago Maldonado e o apoio que o governo escolheu dar às autoridades policiais no caso. Também mencionam o caso do mapuche Rafael Nahuel, “assassinado pelas forças policiais, numa ação criminosa justificada publicamente por altos funcionários”.

Falam das disputas territoriais entre as etnias e os grupos econômicos, nas quais – segundo os intelectuais – o Governo atuou em favor dos últimos, e referem à RAM (Resistência Ancestral Mapuche, organização que o governo aponta como inimigo interno) “cuja existência e acionar carecem de provas convincentes”.

O texto afirma que o Governo impulsa “uma política de demonização daqueles que se expressam contra o modelo extrativista”. Em “uma gestão governamental que só reconhece os direitos do capital” em “conivência com certos discursos e representações sociais dos setores mais conservadores e reacionários da sociedade argentina”.

Com relação ao acionar policial, indicam que “o Governo alimenta a ideia de que a morte do delinquente é uma alternativa. Hoje se fala de uma `nova doutrina´, que busca justificar as ações de repressão estatal. Não se trata de um plano sistemático (pela improvisação com que se maneja, e porque ainda conserva alguns `freios políticos´), mas tampouco são meras afirmações desafortunadas ou fatos isolados”.

“Que o próprio presidente felicite em público um agente policial processado por abusos no exercício de suas funções, e responsável pela morte de um suposto delinquente, é de uma gravidade difícil de exagerar: nenhum governo pode celebrar nunca a morte de alguém, tampouco pode dizer que alguém que mata é um exemplo”, afirmam.

Sobre o âmbito econômico, o documento sustenta que “o discurso constitucional do Governo também aparece degradado: os direitos estabelecidos na Constituição não são tratados hoje como direitos invioláveis e incondicionais, e sim como resíduos de um programa que prioriza e garante benefícios e rendas ao capital mais concentrado”.

A declaração conclui dizendo que o Governo se baseia “no falso axioma de que a retomada do crescimento gerará mais empregos e melhor distribuição de renda, o que é teórica e historicamente insustentável“.

(*) Rubén Armendáriz é jornalista e cientista político uruguaio, analista do Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)

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