Brasil: recortes en ciencia de hasta un 45% afectan investigaciones en universidades del país

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Cortes de até 45% afetam pesquisa em universidades federais no RS

Alunos, professores e funcionários das universidades federais no RS têm acompanhado há meses os impactos do corte orçamentário promovido em nível nacional. Apesar do anúncio feito pelo Ministério da Educação (MEC), na sexta-feira, do aumento do limite de empenho para custeio e investimento no Ensino Superior público, com a liberação de R$ 450 milhões a serem distribuídos entre todas as universidades e institutos federais, os recursos para investimentos ainda são limitados a 45% do orçamento previsto. No Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), o corte é de 44% nos repasses do governo.

MEC e MCTIC viram suas verbas serem reduzidas em março, quando o governo federal anunciou um contingenciamento de R$ 42,1 bilhões das contas públicas. Em razão disso, redução de despesas em obras, dificuldades de manutenção de serviços terceirizados e problemas com segurança estão entre os impactos mais fortemente sentidos no dia a dia dessas instituições públicas. Menos perceptível, outro cenário também preocupa: a diminuição dos repasses afeta a pesquisa, área essencial da vida acadêmica.

Se, nas salas de aula e nos corredores, efeitos como falta de limpeza e falhas em equipamentos como ventiladores ficam claros, as consequências são menos visíveis nos laboratórios. Muitos têm ferramentas disponíveis, pessoal capacitado para operá-las, estruturas em dia. O trabalho nesses locais, contudo, está prejudicado: há menos verbas para financiar o andamento de projetos e menos editais para incentivar o início de outros.

Quanto aos valores anunciados na sexta, conforme o pró-reitor de planejamento da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Otávio Peres, «não passam de mais uma parcela do limite orçamentário do Orçamento Anual de 2017» — nada além do que as instituições já estavam aguardando. De acordo com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), «não se trata de suplementação orçamentária, nem descontingenciamento».

O impacto desse cenário, conforme pesquisadores, reitores e coordenadores de cursos ouvidos por ZH, já é sentido dentro dos espaços institucionais. A longo prazo, no entanto, os efeitos podem tomar proporções para além dos campi, resultando em profissionais menos capacitados, economia fragilizada e capacidade restrita de inovação em áreas como saúde e tecnologia.

— Projetos estão sendo afetados desde o início de 2015, quando houve uma redução bastante significativa no aporte de recursos federais para apoio à pesquisa — descreve Odir Dellagostin, diretor-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs).

Dellagostin relata que, nos últimos anos, atrasos em pagamentos destinados a iniciativas acadêmicas em diversas áreas do conhecimento se tornaram constantes. Para os pesquisadores, os cortes no orçamento de órgãos como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), além da própria Fapergs, comprometem o desenvolvimento de projetos que, sem verba, ficam parados — correndo o risco de terminar com atraso, se ao menos chegarem a uma conclusão.

— Por várias razões, a universidade pública tradicionalmente investe muito em pesquisa, o que resulta em impacto significativo no desenvolvimento nacional. Isso mudou. Hoje, falta investimento na formação de recursos humanos, na incorporação de tecnologias, na contratação de pessoal mais qualificado — lamenta o pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Airton Stein.

Diante desse cenário, as universidades federais se veem obrigadas a eleger prioridades, tendo de decidir por cortes em ações de ensino, pesquisa ou extensão. Optando pela manutenção dos serviços de assistência estudantil e pelo pagamento aos professores, o resultado tem sido redução de verba direcionada à compra de equipamentos e à realização de obras, além eda interrupção de planos de expansão.

Prejuízos que são difíceis de estimar

Pouco visíveis, os prejuízos diretos da diminuição de verbas para a pesquisa nas universidades federais são considerados difíceis de estimar.

— A impressão é de que isso não tem um impacto imediato para a sociedade. Nos serviços de saúde, fecha-se uma emergência e o impacto é sentido na hora. Já os efeitos na pesquisa serão sentidos a médio e longo prazos — estima o pró-

reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UFCSPA, Airton Stein. — Mas quem vai ter mais condições de desenvolver projetos inovadores e positivos no mercado é quem estiver se preparando melhor academicamente — completa.

Os pesquisadores relatam o desenvolvimento de um «círculo vicioso» com a falta de recursos: com menos oferta de bolsas, ingressam menos pós-graduandos, resultando em menos pesquisas e menor produção acadêmica, o que leva a uma menor percepção de relevância da universidade e, consequentemente, a menores chances de ter projetos contemplados com recursos públicos e privados.

— Quando um laboratório começa a ficar sem recursos, todas as pesquisas são afetadas, o que envolve grupos de vários docentes e alunos de pós-graduação que precisam reduzir gastos, modificar a metodologia das pesquisas e buscar alternativas mais baratas, que não exijam tantos recursos — afirma o diretor-presidente da Fapergs.

Com a necessidade de se adaptar ao contingenciamento de recursos do governo para investimentos, acadêmicos temem que a produção científica acabe prejudicada. Com pouca perspectiva de conseguir adquirir e fazer uso de equipamentos de ponta, áreas como ciências exatas e da saúde em universidades públicas podem acabar tendo de optar por fazer pesquisas consideradas mais simples — não de menor qualidade, mas de complexidade reduzida em relação ao que poderia ser realizado.

— Pode-se acabar fazendo pesquisa «do jeito que dá», o que é extremamente maléfico para a universidade, para o país — relata Marcio Nunes Corrêa, coordenador do Núcleo de Pesquisa, Ensino e Extensão em Pecuária da UFPel.

Coordenador de Inovação Tecnológica da universidade, Vinicius Farias Campos diz que a possibilidade de agregar valor direto à ciência e à economia nacionais com o desenvolvimento de tecnologias acaba diminuindo — um impacto que ele compara ao do escambo de tempos coloniais. A diferença é que, hoje, estaríamos trocando caminhões de soja por iPhones.

Projetos interrompidos pela falta de recursos

É debaixo de um teto com tijolos expostos e com vastas janelas cobertas por papel pardo que professores e estudantes de graduação e pós-graduação dão prosseguimento às atividades do Núcleo de Pesquisa, Ensino e Extensão em Pecuária da UFPel. Na estrutura, inaugurada neste ano, os laboratórios acumulam equipamentos inutilizáveis por falta de manutenção ou subaproveitados porque carecem de espaço para utilização ou de verba para a aquisição de materiais.

— São equipamentos caros, que chegam por via pública e deveriam estar sendo usados para o bem da sociedade, mas que acabam parados — pondera o coordenador do núcleo, o professor de Medicina Veterinária Marcio Nunes Corrêa. — A inovação é gerada por meio da pesquisa científica. Se o país quer inovar, se desenvolver, como vai conseguir se mal investe na pesquisa de base? — conclui.

Na mesma universidade, a área de ciências biológicas também sofre com a falta de verbas. Apesar da estrutura bem conservada, com salas equipadas e contas em dia, os laboratórios acabam produzindo menos do que sua capacidade. Premiado pela Capes em 2012 por sua tese em nanobiotecnologia, o professor Vinicius Farias Campos relata ter recebido, até hoje, menos da metade dos cerca de R$ 150 mil previstos para o desenvolvimento de seu projeto — o que, segundo ele, atrasa a produção de tecnologia que poderia levar, no futuro, ao maior desenvolvimento do país.

— Um projeto que poderia ser concluído em um ano, dois, acaba levando quatro, cinco anos pela falta de recursos. A gente não consegue empenhar os valores de que necessita porque está tudo contingenciado — diz Campos.

Alguns relatam usar dinheiro próprio

Apesar de não ter sido atingida pelos cortes no orçamento, a pesquisadora da UFCSPA Katya Rigatto conta que teve parte de um projeto afetado pela redução nos investimentos voltados à pesquisa. Contemplada com recursos de um programa da Capes que previa o intercâmbio de pesquisadores de universidades internacionais, ela viu justamente a visita de um professor norte-americano para troca de experiência com seu grupo de pesquisa em Porto Alegre ser reprovada pelo governo.

— O pior é ter de interromper as pesquisas no meio. Isso gasta dinheiro de todo mundo. E se não tem continuidade, esse trabalho todo vai para o lixo. Inviabilizar a continuidade de projetos em andamento é dinheiro posto fora — afirma a professora de fisiologia.

No caso dela, a colaboração com o pesquisador convidado acabou acontecendo porque, interessado na troca de experiências, ele pagou do próprio bolso a viagem ao Brasil — alternativa por vezes adotada por acadêmicos que não querem esperar a demorada e cada vez mais difícil liberação de verbas federais. Muitos relatam ter erguido bancadas, arrumado portas, consertado equipamentos com dinheiro retirado de recursos próprios.

Professor de bioquímica na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Félix Soares tampouco conseguiu dar início a um projeto aprovado em 2014 porque só recebeu um terço da verba prevista para o desenvolvimento. Ele explica que esses problemas criam um efeito cascata, afetando toda a economia — desde os bolsistas de iniciação científica que deixaram de ser pagos até o comerciante que importava produtos específicos para vender às universidades.

— Muitos dos formuladores veem ciência e tecnologia como gasto, não enxergam que isso é investimento. O dinheiro empregado em pesquisa nunca é perdido, acaba sempre retornando ao país — garante Soares.

Pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) e da UFRGS também relataram à reportagem ter sentido os efeitos da falta de repasses, porém muitos preferem não se pronunciar porque tentam contato direto com os órgãos de fomento na tentativa de ter iniciativas aprovadas.

Segurança e obras também são afetadas

A pesquisa, porém, não é a única afetada. Universidades e institutos federais vêm enfrentando, desde o primeiro semestre, dificuldades para manter serviços básicos. Contas de água e luz têm sido parceladas, servidores terceirizados foram demitidos e gastos essenciais, congelados. Com os recursos previstos, algumas instituições estimam que terão problemas para manter suas atividades em dia até o fim do ano letivo.

Em nota, a UFRGS afirmou que «se não houver a liberação dos recursos de custeio e de capital ou até mesmo uma suplementação orçamentária, a universidade terá dificuldades para manter seu funcionamento». Entre os problemas, a instituição relata que «a impossibilidade de se realizarem obras é muito grave, mas a ausência de verbas para equipamentos de laboratórios, salas de aula e para a própria administração da universidade é preocupante».

Também por meio de nota, a UFSM declarou que «as despesas com obras e equipamentos tiveram o maior impacto com a política de cortes orçamentários nestes últimos anos».

No campus de Cachoeira do Sul, dos R$ 130 milhões previstos para o investimento nas obras, somente R$ 6 milhões foram repassados pelo governo federal. E, dos 111 professores e 133 técnico-administrativos pactuados com o MEC previstos para atuação no campus, somente 67 professores e 37 técnicos foram contratados.

Entre as ações tomadas neste ano, a universidade informa que reduziu 27 postos de vigilância no campus sede, em Santa Maria. Com isso, foram demitidos cerca de 54 vigilantes terceirizados, conforme a empresa fornecedora. Mas a UFSM garante que a segurança no campus não foi prejudicada, já que foi implantado um novo sistema de monitoramento.

Projetando déficit de R$ 30 milhões neste ano, a UFPel estima que, entre todas as federais do país, tenha o orçamento que menos cresceu entre 2013 e 2017. «Estamos tendo dificuldades quanto ao pagamento das contas regulares, especialmente as que dizem respeito aos serviços terceirizados e às despesas com energia elétrica, água e telefone», destacou em nota.

Restrições de verba ameaçam o pagamento de bolsas

Com as finanças esgotadas, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), um dos maiores financiadores da pesquisa no Brasil, estima que não terá dinheiro para pagar bolsas e projetos a partir de setembro, caso seu orçamento não seja desbloqueado pelo governo federal. De acordo com o conselho, cerca de 90 mil bolsistas e 20 mil pesquisadores poderão ser prejudicados pela interrupção dos pagamentos.

O orçamento do CNPq aprovado para este ano é de R$ 1,3 bilhão, dos quais foram executados R$ 672 milhões até julho. Por causa do contingenciamento, o órgão está autorizado a gastar apenas 56% do total previsto, o que equivale a cerca de R$ 730 milhões. Seria necessária a liberação de R$ 505 milhões dos recursos do CNPq para garantir a normalidade das operações até o final do ano.

O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) afirma que «recursos para o pagamento das bolsas para o mês de agosto estão assegurados, e o ministério trabalha junto à equipe econômica pela recomposição orçamentária e normalidade nos repasses do órgão nos próximos meses».

Estudantes dos programas de pós-graduação da Unisinos, da UFRGS e da PUCRS emitiram nota de preocupação com cortes no orçamento da ciência no Brasil. Para eles, «essa é uma situação singular na história do país, que põe em xeque o desenvolvimento científico em um cenário já nada animador para os bolsistas, postulantes a novos cientistas». Os universitários defendem «não apenas a manutenção das bolsas, mas que o governo federal dê a devida importância ao campo científico como base para o desenvolvimento nacional, o aprimoramento das instituições, o enriquecimento dos vínculos sociais e da cultura brasileira».

Manifestações

O QUE DIZ O GOVERNO

Ministério da Educação

«Para 2017, o limite de empenho previsto inicialmente para as universidades é de 85% do valor previsto para despesas de custeio e de 60% para despesas de capital. No entanto, o MEC está trabalhando para aumentar esse limite, assim como fez no ano passado, quando, mesmo após o contingenciamento feito pelo governo anterior, conseguiu liberar 100% de custeio para as universidades.»

Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações

«Para este ano, o limite de empenho para o ministério é de R$ 3,27 bilhões, de um total de R$ 5,81 bilhões, o que representa um corte de 44%. O MCTIC trabalha pela recomposição orçamentária, atuando junto aos Ministérios da Fazenda e do Planejamento pelo descontingenciamento de recursos, que afetaram os diferentes órgãos do governo federal.»

CNPq

«O orçamento aprovado para o CNPq em 2017 foi de R$ 1,3 bilhão, dos quais foram executados R$ 672 milhões até julho. É necessário que ocorra o descontingenciamento de R$ 505 milhões dos recursos do CNPq para garantir a normalidade das operações até o final do ano. É necessária uma ampliação imediata dos limites para garantir a continuidade do pagamento das bolsas e execução dos projetos de pesquisa.»

O QUE DIZEM AS UNIVERSIDADES

UFRGS

A universidade afirmou, por meio de nota, que «a atividade de pesquisa já está comprometida pela redução de verbas. Os efeitos dessa redução serão gradualmente maiores na medida em que não houver a renovação de verbas para a manutenção de projetos em andamento e liberação orçamentária para projetos novos».

UFSM

Em nota, a reitoria destacou que «a redução do orçamento não tem permitido atender o valor dos recursos orçados nos projetos nem mesmo a intensidade real da demanda. De 2014 a 2017, a universidade informa que deixou de receber limites orçamentários para suas ações de ensino, pesquisa e extensão na ordem de R$ 144,98 milhões.

Furg

Conforme Eduardo Resende Secchi, pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, não é possível manter o ritmo das pesquisas em andamento com a redução no investimento federal.

UFPel

O reitor Pedro Curi Hallal afirmou que o cenário de investimento atual é «manter o que tem de estrutura» e relata prejuízos na execução de projetos de expansão e investimentos no ensino.

Unipampa

Segundo o pró-reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, José Pedro Rebés, a redução orçamentária ainda não afetou o andamento das pesquisas na Unipampa.

UFCSPA

De acordo com o pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, Airton Stein, «o que mais se vê são coordenadores (de grupos de pesquisa) dizendo que não têm como manter integralmente as atividades».

Zero Hora Educação

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