Henrique Capriles, líder opositor venezolano: «El modelo implementado por Chávez se agotó»

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Modelo implementado por Chávez se esgotou, diz principal líder opositor

A crise na Venezuela chegou a tal ponto que o chavismo vive seu pior momento em 16 anos de governo. A oposição, por sua vez, nunca teve tanta força apesar das divergências internas.

A aposta é de Henrique Capriles, 42, principal líder da oposição ao presidente Nicolás Maduro e governador do Estado de Miranda, onde se situa parte de Caracas.

Na última sexta (30), a Folha acompanhou Capriles num evento de
assistência social num vilarejo pobre a duas horas da capital.

Após distribuir cestas básicas e material de construção, sob olhar ostensivo do serviço de inteligência, Capriles disse que o aval recém­dado pelo governo a militares para atirar em manifestantes tenta desviar o foco da crise.

Mas o governador rejeita apelos para derrubar Maduro –que sucedeu Hugo Chávez em 2013– pela pressão das ruas. Capriles também fez críticas a Lula.

Folha – Como o senhor vê a resolução permitindo que soldados atirem em manifestantes?

Henrique Capriles ­- O artigo 68 da Constituição proíbe usar armas de fogo em manifestações. Protestos não se dispersam com bala, mas com água, gás lacrimogêneo.

Peço aos militares que ignorem a resolução e lhes pergunto: vocês querem ficar impopulares e ser associados a esse desastre?

É típico deste governo lançar algo grave que gere debate para desviar de temas como a crise econômica e o cartel de Los Soles [facção do tráfico de drogas que opera nas Forças Armadas].

A acusação de tráfico de drogas contra o chefe do Legislativo, Diosdado Cabello, pode ter surgido dentro do próprio governo?

Parece, sim, haver uma guerra no governo. É normal que chavistas tenham a mesma dúvida que 80% dos venezuelanos: será que os líderes não enxergam a crise?

E o pior está por vir, porque ainda não vimos os efeitos da queda do preço de petróleo. Hoje caminhamos com os preços do ano passado, pois as vendas são a futuro. Sentiremos o impacto em março.

O Orçamento nacional foi calculado com base num barril a US$ 60. Hoje entram US$ 40 por barril. A conta não fecha. Isso não se resolve aumentando impostos e gasolina nem desvalorizando a moeda, coisas que até poderiam equilibrar contas do governo em bolívares, mas não resolvem o problema de fundo: não ter dólares para contas externas. Alguém acha que a Odebrecht vai aceitar pagamento em bolívares?

O senhor vê o governo «em fase terminal». Como será o fim?

O governo deve sair de maneira constitucional. As eleições parlamentares estão perto [em dezembro]. Depois haverá possibilidade de referendo revogatório [do mandato de Maduro]. A Constituição dá vários caminhos. Fora da Constituição, não aceito nada.

Há quem diga que o governo não cai sem protestos.

Meu tipo de mobilização não é a marcha tradicional. Onde estamos neste instante? Na rua [em Acevedo], organizando pessoas, conscientizando. Aqui há mulheres que farão um grupo para denunciar a falta de comida.

É o tipo de pressão social que permite vencer a censura e a propaganda do governo. A TV estatal só mostra mercados cheios de produtos e todo mundo numa boa como se não houvesse filas.

Mas a oposição venezuelana até hoje nunca capitalizou o descontentamento.

O país mudou com a eleição de Maduro. Acabou a polarização. Hoje é:
venezuelanos contra governo, não mais chavistas contra opositores. É o pior momento na história do governo e o melhor momento para os que querem mudança.

No pleito municipal [2013] houve o dakazo [as autoridades obrigaram as lojas de eletrodomésticos Daka a vender produtos a preço irrisório], que aumentou em 11% a popularidade do governo. Mas os dakazos foram a última cartada de Maduro. Ali o governo tinha 50% de apoio. Hoje tem 80% de rejeição.

Se chegasse à Presidência do país, qual seria sua primeira medida?

Deixaria de mandar petróleo de presente [a países aliados]. Devolveria empresas expropriadas. Algumas estão em ruínas, então chamaria os antigos donos para ver como faríamos, setor privado e público, para que voltassem a produzir.

Manteria programas sociais?

Um país com nossos níveis de pobreza precisa de programas sociais até que se reduza a população carente. O Brasil tirou muita gente da pobreza. Como? Com emprego. É o que diminui aos poucos a dependência com o governo.

O senhor consultou o Brasil para implementar no Estado de Miranda uma versão local do Fome Zero?

Não, apenas estudei o tema. Minha última conversa com o governo do Brasil foi com o [então chanceler Luiz Alberto] Figueiredo, quando ele veio no ano passado [para mediar a crise causada por violentos protestos antigoverno].

Sinto que o Brasil está muito perto e ao mesmo tempo muito longe. Como assim?

A presidente Dilma [Rousseff] não se atreve a dizê­lo, mas ela sabe que isto aqui é um desastre e que o modelo venezuelano não serve.

Setores do governo brasileiro veem a oposição venezuelana como golpista.

Duvido que o governo brasileiro me ache golpista. Se for assim, tudo que disseram nas nossas conversas é mentira. E eu nunca gostei de ver o Lula fazendo campanha na Venezuela [em favor do chavismo]. Pegou mal. Lula merece coisa melhor. Digo isso porque entendo que ele quer voltar a ser presidente.

O senhor reconhece conquistas chavistas?

Entraram US$ 800 bilhões [de renda petroleira] nos últimos 12 anos neste país, que tem apenas 30 milhões de habitantes. E hoje não há sabão para lavar a roupa.

Chávez surgiu graças ao vácuo deixado pela implosão do modelo anterior a ele. Ele soube pôr na linha de frente o tema da pobreza, da gente que sofria.

Mas ele já não está. Da mesma forma que acabou a quarta república [1830­ 1998], o modelo de governo implementado por Chávez também se esgotou.

Qual será seu papel nas eleições parlamentares?

Impulsionar [aliados]. Para isso só tenho estas duas pernas. Sou a pessoa mais censurada no país. O objetivo do governo é invisibilizar Capriles. Farei o que humanamente puder.

Por que há um carro com letreiro do serviço de inteligência aqui
perto enquanto falamos?

Menos mal que tenham estacionado à distância. Se ficassem mais perto teríamos problemas. Não é comum, mas já aconteceu. Pela lei, estes senhores estão sob minha autoridade em Miranda. Sou pacífico, mas não sou otário. E não estou sozinho.

O governo está fragilizado. Não quero explosão social, mas chega um ponto em que se perde a paciência. Quem se aproxima das chamas pode se queimar. E Maduro está se aproximando das chamas.

O que responde aos que dizem que a prisão [do opositor] Leopoldo
López [acusado de incitar protestos em 2014] favorece o senhor?

Todos na MUD (Mesa da Unidade Democrática) queremos que seja solto. Mas tomara que o caso sirva de lição para todos. Quando ele sair, voltaremos a debater sobre nossas diferenças acerca do foco e do método de fazer política. Mas, diante da crise, essas diferenças são pequenas.

O público vê essas diferenças como fraqueza.

Queremos convencer os já convencidos ou os não convencidos? É preciso fazer política na praça Altamira [bairro nobre] ou neste município [Acevedo]? Onde vive a maioria dos venezuelanos? Em lugares como aqui. Estamos recompondo a MUD, e Leopoldo é parte dela. Ele tem mais visibilidade, mas não é o único preso.

Se Maduro renunciar, o senhor seria o candidato da oposição no
pleito que se convocaria?

Não vislumbro a renúncia de Maduro. Não acho que pense nisso. De todo modo, é hora de pensar nas parlamentares, não na presidencial. Um dia de cada vez.

Folha de S. Paulo

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