El golpe de Estado y sus artes (Brasil) – Por Alipio Freire
Los conceptos vertidos en esta sección no reflejan necesariamente la línea editorial de Nodal. Consideramos importante que se conozcan porque contribuyen a tener una visión integral de la región.
Os golpistas e suas artes
No artigo “Chegou a hora” (“Estadão”, 1°.02.2015), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou publicamente sua determinação em promover um golpe de Estado contra a presidenta Dilma Rousseff, delegando ao Poder Judiciário a tarefa de ruptura da Constituição (da legalidade). Em Honduras e no Paraguai, o método já foi testado com sucesso – mais um truque dos EUA.
As armas dos nossos golpistas são de conhecimento público: o impeachment da presidenta Dilma Rousseff; a questão Petrobras; as novas denúncias da revista IstoÉ desta semana; e a Constituinte Exclusiva.
Entendemos que, no caso do impeachment, o mais viável é transformá-lo em permanente espada de Dâmocles sobre a cabeça da presidenta para tentar forçar acordos, mas nada impede que possa ser acionado – quando convier aos golpistas –, abrindo três possibilidades: a conclusão do mandato pelo vice Michel Temer; o impeachment também do vice e a convocação imediata de novas eleições; ou, ainda, o impeachment do vice Temer, seguido de um mandato tampão, a ser exercido pelo presidente da Câmara em exercício, ou por algum nome consensuado entre os partidos.
Sobre os escândalos da Petrobras – e que têm como objetivo maior a privatização do nosso monopólio Estatal de Petróleo – ele também prosseguirá ainda por muito tempo, pelo menos até 2016 (ano eleitoral) ou até 2018 (eleições presidenciais).
O caminho das investigações sobre a estatal, no entanto, tomará diferentes rumos, de acordo com cada conjuntura. E aqui entram as denúncias da IstoÉ, que articulam os escândalos da petroleira com o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel (2002), cujo processo deverá ser reaberto. Sempre de acordo com a revista, as duas questões supostamente se articulariam através do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e seus ex-ministros José Dirceu de Oliveira e Silva e Gilberto Carvalho. Ou seja, fica claro que esse expediente coloca no horizonte e no médio prazo, as eleições de 2018.
Sobre a Constituinte Exclusiva – a respeito do que já escrevemos no texto “Com que roupa, eu vou?” (edição 614), equivocou-se o PT ao lançá-la desde meados de 2013 e, mais ainda, erigi-la em programa durante a campanha presidencial que se seguiu. A atual correlação de forças não nos é (já não era em 2013) favorável, e tememos que a Constituinte Exclusiva possa se tornar um tiro no nosso próprio pé, com um retrocesso das conquistas de interesse dos trabalhadores e do povo (povo = explorados e oprimidos), obtidas em 1988.
Por fim, lembramos que o quadro brasileiro não pode ser pensado à margem das desestabilizações em curso em países vizinhos (Argentina, Venezuela, Colômbia etc.), o que implica buscarmos entender a geopolítica estadunidense para o Continente.
Chegou a hora – Por Fernando Henrique Cardoso
Há o temor de a liderança nacional não perceber que a crise não é corriqueira; a Justiça precisa ter a ousadia de chegar aos mais altos hierarcas culpados
uando eventualmente este artigo vier a ser lido, a Câmara dos Deputados estará escolhendo seu novo presidente. Ganhe ou perca o governo, as fraturas na base aliada estarão expostas. Da mesma maneira, o esguicho da Operação Lava-Jato respingará não só nos empresários e ex-dirigentes da Petrobras nomeados pelos governos do PT, mas nos eventuais beneficiários da corrupção que controlam o poder. A falta de água e seus desdobramentos energéticos continuarão a ocupar as manchetes.
Não se precisa saber muito de economia para entender que a dívida interna (três trilhões de reais!), os desequilíbrios dos balanços da Petrobras e das empresas elétricas, a diminuição da arrecadação federal, o início de desemprego, especialmente nas manufaturas, o aumento das taxas de juros, as tarifas subindo, as metas de inflação sendo ultrapassadas dão base para prognósticos negativos do crescimento da economia.
Tudo isso é preocupante, mas, não é o que mais me preocupa. Temo, especialmente, duas coisas: o havermos perdido o rumo da História e o fato da liderança nacional não perceber que a crise que se avizinha não é corriqueira — a desconfiança não é só da economia, é do sistema político como um todo. Quando esses processos ocorrem não vão para as manchetes de jornal. Ao entrar na madeira, o cupim é invisível; quando percebido, a madeira já apodreceu.
Por que temo havermos perdido o rumo? Porque a elite governante não se apercebeu das consequências das mudanças na ordem global. Continua a viver no período anterior, no qual a política de substituição das importações era vital para a industrialização. Exageraram, por exemplo, ao forçar o “conteúdo nacional” na indústria petrolífera, excederam-se na fabricação de “campeões nacionais” à custa do Tesouro. Os resultados estão à vista: quebram-se empresas beneficiárias do BNDES, planejam-se em locais inadequados refinarias “premium” que acabam jogadas na vala dos projetos inconclusos. Pior, quando executados, têm o custo e a corrupção multiplicados. Projetos decididos graças à “vontade política” do mandão no passado recente.
Pela mesma cegueira, para forçar a Petrobras a se apropriar do pré-sal, mudaram a lei do petróleo que dava condições à estatal de concorrer no mercado, endividaram-na e a distanciaram da competição. Medida que isentava a empresa da concorrência nas compras, transformou-se em mera proteção para decisões arbitrárias que facilitaram desvios de dinheiro público.
Mais sério ainda no longo prazo: o governo não se deu conta de que os Estados Unidos estavam mudando sua política energética, apostando no gás de xisto com novas tecnologias, buscando autonomia e barateando o custo do petróleo.
O governo petista apostou no petróleo de alta profundidade, que é caro, descontinuou o etanol pela política suicida de controle dos preços da gasolina, que o tornou pouco competitivo e, ainda por cima (desta vez graças à ação direta de outra mandona), reduziu a tarifa de energia elétrica em momento de expansão do consumo, além de ter tomado medidas fiscais que jogaram no vermelho as hidrelétricas.
Agora todos lamentam a crise energética, a falta de competitividade da indústria manufatureira e a alta dos juros, consequência inevitável do desmando das contas públicas e do descaso com as metas de inflação.
Os donos do poder esqueceram-se de que havia alternativas, que sem renovação tecnológica os setores produtivos isolados não sobrevivem na globalização e que, se há desmandos e corrupção praticados por empresas, eles não decorrem de erros do funcionalismo da Petrobras, nem exclusivamente da ganância de empresários, mas de políticas que são de sua responsabilidade, até porque foi o governo quem nomeou os diretores ora acusados de corrupção, assim como foram os partidos ligados a ele os beneficiados.
Preocupo-me com as dificuldades que o povo enfrentará e com a perda de oportunidades históricas. Se mantido o rumo atual, o Brasil perderá um momento histórico e as gerações futuras pagarão o preço dos erros dos que hoje comandam o país. Depois de 12 anos de contínua tentativa de desmoralização de quase tudo que meu governo fez, bem que eu poderia dizer: estão vendo, o PT beijou a cruz, tenta praticar tudo que negou no passado — ajuste fiscal, metas de inflação, abertura de setores públicos aos privados e até ao “capital estrangeiro”, como no caso dos planos de saúde.
Quanto ao “apagão” que nos ronda, dirão que faltou planejamento e investimento como disseram em meu tempo? Em vez disso, procuro soluções.
Nada se consertará sem uma profunda revisão do sistema político e, mais especificamente, do sistema partidário e eleitoral. Com uma base fragmentada e alimentando os que o sustentam com partes do Orçamento, o governo atual não tem condições para liderar tal mudança. E ninguém em sã consciência acredita no sistema prevalecente. Daí minha insistência: ou há uma regeneração “por dentro”, governo e partidos reagem e alteram o que se sabe que deve ser alterado nas leis eleitorais e partidárias, ou a mudança virá “de fora”. No passado, seriam golpes militares. Não é o caso, não é desejável nem se veem sinais.
Resta, portanto, a Justiça. Que ela leve adiante a purga; que não se ponham obstáculos insuperáveis ao juiz, aos procuradores, delegados ou à mídia. Que tenham a ousadia de chegar até aos mais altos hierarcas, desde que efetivamente culpados. Que o STF não deslustre sua tradição recente. E, principalmente, que os políticos, dos governistas aos oposicionistas, não lavem as mãos. Não deixemos a Justiça só. Somos todos, responsáveis perante o Brasil, ainda que desigualmente. Que cada setor político cumpra sua parte e, em conjunto, mudemos as regras do jogo partidário eleitoral. Sob pena de sermos engolfados por uma crise, que se mostrará maior do que nós.